terça-feira, junho 30, 2020

TJPR exclui condenação por dano moral decorrente de “infidelidade virtual”


No 1º Grau de Jurisdição, indenização foi fixada em R$ 30 mil

Seg, 29 Jun 2020 12:41:28 -0300

Em uma ação de divórcio, além da resolução de questões envolvendo a guarda de um filho e a prestação de alimentos, o autor do processo pediu indenização por danos morais, alegando que foi traído durante o casamento, fato que teria causado o fim do relacionamento. No processo, o ex-marido argumentou que a situação o transformou em alvo de comentários e chacotas. A descoberta do relacionamento extraconjugal da ex-cônjuge ocorreu quando ele leu, no celular dela, mensagens trocadas com outro homem.

Na sentença, concluiu-se que a então esposa descumpriu o dever conjugal de fidelidade e por isso foi fixada indenização por danos morais em R$ 30 mil reais. Constou da decisão: "O dano inclusive é presumível, pois o desconforto da traição, que não é causa banal, abala qualquer um que a experimente”. 

A ex-esposa recorreu ao Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) e pediu o afastamento da condenação por danos morais. Segundo ela, não haveria traição, porque ambos não mais detinham relação marital e o próprio ex-marido teria exposto as mensagens a terceiros.

 

Exclusão da condenação – Direitos fundamentais versus deveres conjugais

Na quarta-feira (24/6), em sessão de julgamento por videoconferência, depois de debates e votação, a 12ª Câmara Cível do TJPR, por maioria de votos, excluiu a condenação por dano moral fixada na sentença, entendendo que estavam ausentes os requisitos da responsabilidade civil. Segundo a Desembargadora relatora “a infidelidade de um cônjuge, muito embora cause sofrimento ao outro, nem sempre importará a consumação de dano moral indenizável”. 

Além disso, a relatora ressaltou que a ex-cônjuge não expôs e não ridicularizou o ex-marido, observando que o próprio autor do processo enviou para outras pessoas o conteúdo que ele encontrou no celular. Por acessar o aplicativo de mensagens sem o consentimento da ex-esposa, a magistrada concluiu que a prova da infidelidade teria sido obtida por meio ilícito.

“Temos uma dicotomia de direitos violados: se por um lado há uma violação dos deveres matrimoniais (estamos falando de fidelidade e sabemos quanta dor isso causa naquele que sofre a infidelidade), por outro lado temos direitos fundamentais na Constituição Federal, que são o direito à inviolabilidade da correspondência e à privacidade, ambos violados sem autorização da proprietária do celular”, assinalou a relatora no dia 10 de junho, quando teve início o julgamento.

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Constituição Federal
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (...)

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;  

Código Civil
Art. 1.566 - São deveres de ambos os cônjuges:
I - fidelidade recíproca;
II - vida em comum, no domicílio conjugal;
III - mútua assistência;
IV - sustento, guarda e educação dos filhos;
V - respeito e consideração mútuos.

quarta-feira, março 11, 2020

Para Quarta Turma, situações excepcionais podem justificar adoção de menor pelos avós


​​Apesar da proibição prevista no parágrafo 1º do artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a adoção pelos avós (adoção avoenga) é possível quando for justificada pelo melhor interesse do menor.


Seguindo esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso do Ministério Público e manteve decisão que permitiu a adoção de uma criança pela avó paterna e por seu companheiro, avô por afinidade.


O colegiado alinhou-se à posição da Terceira Turma, que, em casos julgados em 2014 e 2018, já havia permitido esse tipo de adoção para proteger o melhor interesse do menor.


Segundo o relator do recurso analisado pela Quarta Turma, ministro Luis Felipe Salomão, a flexibilização da regra do ECA, para autorizar a adoção avoenga, exige a caracterização de uma situação excepcional.


Entre as condições para isso, Salomão destacou a necessidade de que o pretenso adotando seja menor de idade; que os avós exerçam o papel de pais, com exclusividade, desde o nascimento da criança; que não haja conflito familiar a respeito da adoção e que esta apresente reais vantagens para o adotando.



Dependência qu​​​​ímica


O recurso julgado diz respeito a uma mãe que, alguns dias após o parto, entregou a criança aos cuidados da avó paterna e de seu companheiro, que ficaram com a guarda provisória. Oito meses depois, os avós ajuizaram a ação de adoção, informando que os pais biológicos eram dependentes químicos e que a mãe aparecia frequentemente drogada para visitar a criança, ameaçando retomar a guarda.


Na petição inicial, os avós afirmaram que a adoção era necessária para preservar a integridade física do menor. Narraram que seu irmão por parte de mãe havia sido morto em uma possível vingança de traficantes.


Citados, os pais concordaram com a adoção. Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente – decisão confirmada pelo tribunal estadual. Desde o início, o Ministério Público discordou da medida, alegando violação ao texto literal do ECA.



Fim ​​​social


Ao justificar a adoção avoenga, o ministro Salomão se referiu aos precedentes firmados pela Terceira Turma e disse que a medida deve ser permitida em situações excepcionais, como a dos autos, "por se mostrar consentânea com o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente".


Ele considerou que tal possibilidade contempla o fim social objetivado pelo ECA e também pela Constituição de 1988.


Além das condições mencionadas estarem atendidas no caso, Salomão afirmou que o estudo psicossocial atestou a parentalidade socioafetiva entre os adotantes e a criança. Ele ressaltou que o lar reúne condições necessárias ao pleno desenvolvimento do menor.



"A pretensão de adoção funda-se em motivo mais que legítimo, qual seja, desvincular a criança da família materna, notoriamente envolvida em criminalidade, o que já resultou nos homicídios de seu irmão biológico de apenas nove anos de idade e de primos adolescentes na guerra do tráfico de entorpecentes" – enfatizou o relator.



Conceito de fam​​ília


Nesta terça-feira (10), na conclusão do julgamento do recurso, o ministro Marco Buzzi apresentou voto-vista, acompanhando a posição do relator e apontando um fundamento adicional, relativo ao conceito de família para fins de adoção.


Ele lembrou que, quando amplamente demonstradas a afetividade e a afinidade da criança com os parentes que pretendem adotá-la – desde que preenchidos os demais requisitos legais, como a diferença mínima de idade e o rompimento dos vínculos socioafetivos com os pais –, a adoção é plenamente admitida, "já que a própria lei, nos termos do artigo 19 do ECA, assegura à criança e ao adolescente o direito de serem criados e educados no seio de sua família".


O ministro destacou que a criança reconhece a avó paterna como mãe e não tem vínculo afetivo com os pais biológicos.


Esse posicionamento do colegiado, segundo Marco Buzzi, "não constitui ativismo judicial, mas um dever imposto ao julgador intérprete de salvaguardar o melhor interesse da criança e conferir uma ponderação equilibrada e concatenada da vontade social exercida pela atuação do legislador".


O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.




segunda-feira, março 02, 2020

Do “Usucapião Familiar”




Gediel Claudino de Araujo Junior

Usucapião é forma originária de aquisição da propriedade de um bem, seja móvel ou imóvel. Tradicionalmente tínhamos três tipos de usucapião de bens imóveis, quais sejam: o ordinário, o extraordinário e o especial. No entanto, a Lei nº 12.424/2011, que trata do programa Minha Casa Minha Vida, introduziu um quarto tipo de usucapião, que a doutrina e a jurisprudência chamam de “usucapião familiar”.

Segundo o art. 1.240-A do Código Civil, acrescentado pela referida lei, seus requisitos formais são: (I) posse direta, exclusiva, sem oposição e ininterrupta pelo prazo de 2 (dois) anos; (II) que o imóvel seja urbano e com metragem de até 250m/2 (duzentos e cinquenta metros quadrados); (III) que o interessado divida com o ex-cônjuge ou ex-companheiro a “propriedade” do bem; (IV) que o interessado utilize o imóvel para sua moradia ou de sua família; (V) que o co-proprietário, ex-cônjuge ou ex-companheiro, tenha abandonado o lar; (VI) não ser o interessado proprietário de outro imóvel urbano ou rural e não ter anteriormente usado deste benefício.

De forma geral, os requisitos são claros e simples. O que levantou alguma critica da doutrina é o prazo prescricional pequeno, apenas dois anos; já as maiores discussões na jurisprudência sobre o tema envolvem os requisitos para a caracterização do “abandono do lar” por parte do ex-cônjuge ou ex-companheiro.

O correto entendimento sobre estas questões pressupõe que o operador considere o forte aspecto social que está por trás da Lei nº 12.424/2011. Inegável que a intenção do legislador foi proteger principalmente a mulher pobre e abandonada pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro, daí o prazo prescricional tão pequeno. Abandonada, neste caso, é a mulher deixada sozinha para cuidar de si e/ou dos filhos (financeira e emocionalmente). Este tipo de abandono é aquele em que o homem “voluntariamente” some, desaparece; ou seja, se ele fica por perto (tem residência conhecida), mantém contato com a mulher e/ou com os filhos, ainda que de forma esporádica, não se caracteriza o abandono previsto pela norma legal, mesmo que ele não pague pensão alimentícia, que a mulher pode sempre cobrar pelos meios legais (ação de alimentos). Não se deve confundir a inércia do homem com abandono; ou seja, o simples não ajuizamento, conforme o caso, de ação de divórcio, de dissolução de união estável, de partilha de bens ou até o não ajuizamento de ação de arbitramento de aluguel, não faz pressupor que o homem “abandonou o lar” para efeito de caracterizar o usucapião familiar.

Outra questão que merece destaque é a exigência de que o casal seja “proprietário” do bem. Com efeito, em razão do texto do artigo ser expresso quanto a este requisito, alguns juízes indeferem o pedido ao constatar que o casal tinha apenas a posse do bem (lembrando que só é proprietário quem tem título registrado). Este formalismo acaba por ser extremamente restritivo, visto que a grande maioria dos casais pobres só possuem compromissos de compra e venda firmado por terceiros, que não os proprietários, ou são titulares de contrato de financiamento bancários. Sabendo que o legislador quis favorecer a mulher pobre abandonada, a questão não deve se limitar aos casos em que o casal é formalmente proprietário do bem, mas deve, ao nosso ver, alcançar os casos em que o casal seja titular de “direitos possessórios” sobre certo bem imóvel, a fim de possibilitar que no futuro a interessada possa exercer, com exclusividade, os direitos sobre o bem.

O usucapião familiar pode ser reconhecido por meio de ação própria ou ainda no bojo de ação de divórcio ou de dissolução de união estável (no item que trata da partilha do bem, se pede sua adjudicação ao interessado); pode, ainda, ser alegado como defesa em qualquer outra ação que o ex-cônjuge ajuíze buscando a partilha do bem ou cobrança de aluguel, desde que, é claro, tenha ocorrido a prescrição aquisitiva e estejam presentes os demais requisitos legais. Quanto a estes, aliás, o colega advogado não deve olvidar de juntar os documentos necessários à sua prova; ou seja, se pretende alegar como defesa a exceção do usucapião familiar, o interessado deve lembrar de juntar à sua petição de defesa os documentos tendentes a provar especialmente a metragem do imóvel, a posse com “animo domini”, a não propriedade de outros imóveis urbanos ou rurais e o não uso anterior dessa faculdade.


quarta-feira, fevereiro 26, 2020

Consolo Na Praia

Carlos Drummond de Andrade



Vamos, não chores.
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.

O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.

Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis carro, navio, terra.
Mas tens um cão.

Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?

A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.

sexta-feira, fevereiro 21, 2020

PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL PARA O PROCESSAMENTO DO INVENTÁRIO ANTE A EXISTÊNCIA DE TESTAMENTO.


RECURSO ESPECIAL Nº 1.808.767 - RJ (2019⁄0114609-4)
RELATOR    :         MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE      :         SAMUEL CUKIERMAN
RECORRENTE      :         MAURO CUKIERMAN
RECORRENTE      :         ROGERIO CUKIERMAN
ADVOGADOS       :         SÉRGIO SENDER  - RJ033267 e MÔNICA SENDER  - RJ055404
RECORRIDO         :         NÃO INDICADO

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. Lea Cukierman faleceu em 1°⁄2⁄2015, deixando em favor do marido, Samuel Cukierman, e dos dois filhos maiores Mauro Cukierman e Rogério Cukierman, testamento público, devidamente processado e concluído perante a 2ª Vara de Órfãos e Sucessões do Rio de Janeiro, com total concordância dos herdeiros e da Procuradoria do Estado, ficando estabelecido que toda a parte disponível da herança seria destinada ao viúvo.
Em sequência, deu-se início ao inventário judicial, no qual foi requerida a partilha de bens – um imóvel e cotas socias de três empresas –, tendo aquele juízo determinado o processamento da apuração de haveres em três novos processos (distribuídos por dependência).
No entanto, por se tratar de sucessão simples, envolvendo herdeiros maiores, capazes e concordes, diante das novas diretrizes da Corregedoria-Geral do Estado, a despeito de existir testamento já cumprido, requereram os interessados a extinção do feito e a autorização para que o processamento do inventário e da partilha de bens ocorresse de forma extrajudicial.
O magistrado de piso indeferiu o pleito, pelos seguintes fundamentos:
A pretensão deduzida encontra sólido obstáculo no comando contido no artigo 610 do novo CPC, dispositivo esse que repete integralmente o disposto no artigo 982 do CPC revogado, e determina a abertura de inventário judicial em havendo testamento, não contrariado por qualquer norma processual. Outrossim, ainda que se empreste equivocada interpretação aquela norma, data venia, é de se observar que a lei determina que é o juiz que 'deve dar a interpretação da cláusula testamentária que melhor assegure a observância da vontade do testador' (artigo 1899); que trata da 'escolha do legado' (artigo 1930); que declara a 'caducidade' (artigo 1930); que decide sobre o 'direito de acrescer' (artigo 1941); que decide acerca da 'redução das disposições testamentárias' (artigo 1966); sobre o 'registro (artigo 1979); que é o juiz que 'nomeia o testamenteiro, na falta de indicado ou cônjuge' (artigo 1984); e que é o juiz que fixa o prêmio ou vintena' (artigo 1987). E todas essas questões são próprias do processo de inventário judicial, empeço a que se adote o inventário extrajudicial. Por esses motivos, indefiro a pretensão deduzida, e determino o prosseguimento do feito.

Interposto agravo de instrumento, a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou provimento ao recurso, nos termos da seguinte ementa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE INDEFERIU O PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL PARA O PROCESSAMENTO DO INVENTÁRIO ANTE A EXISTÊNCIA DE TESTAMENTO. DECISÃO QUE NÃO MERECE SER REFORMADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 610 DO CPC. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO § 1°, ANTE A EXISTÊNCIA DE TESTAMENTO. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (fls. 43-51)
Irresignados, interpõem recurso especial com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, por negativa de vigência ao art. 610 e § 1°, do CPC⁄15, além de dissídio jurisprudencial.
Sustentam que, "apesar do teor do caput do artigo 610 do novo CPC, o § 1° expressamente permite o processamento do inventário pela via extrajudicial, desde que sejam os herdeiros capazes e concordes"; em verdade "o único impedimento para a aplicação do referido parágrafo primeiro é a existência de incapaz e não a de testamento".
Destacam que o Tribunais pátrios, por meio de provimento de suas Corregedorias de Justiça, têm admitido o inventário extrajudicial, ainda que envolva testamento, haja vista a celeridade alcançada e a garantia de liberdade de escolha dos herdeiros, considerando, na espécie, que o viúvo-meeiro conta com 85 anos de idade.
Argumentam que "este procedimento torna mais rápido o cumprimento do testamento, trazendo visíveis benefícios aos interessados, evitando desnecessárias formalidades e desafogando a enormidade de ações que assoberbam o Poder Judiciário, que ficará responsável por processar apenas aqueles inventários em que houver menores e⁄ou conflitos entre os herdeiros".
O recurso recebeu crivo de admissibilidade positivo na origem (fls. 105-109).
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.808.767 - RJ (2019⁄0114609-4)
RELATOR    :         MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE      :         SAMUEL CUKIERMAN
RECORRENTE      :         MAURO CUKIERMAN
RECORRENTE      :         ROGERIO CUKIERMAN
ADVOGADOS       :         SÉRGIO SENDER  - RJ033267
MÔNICA SENDER  - RJ055404
RECORRIDO         :         NÃO INDICADO

EMENTA
RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSO CIVIL. SUCESSÕES. EXISTÊNCIA DE TESTAMENTO. INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL. POSSIBILIDADE, DESDE QUE OS INTERESSADOS SEJAM MAIORES, CAPAZES E CONCORDES, DEVIDAMENTE ACOMPANHADOS DE SEUS ADVOGADOS. ENTENDIMENTO DOS ENUNCIADOS 600 DA VII JORNADA DE DIREITO CIVIL DO CJF; 77 DA I JORNADA SOBRE PREVENÇÃO E SOLUÇÃO EXTRAJUDICIAL DE LITÍGIOS; 51 DA I JORNADA DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL DO CJF; E 16 DO IBDFAM.
1. Segundo o art. 610 do CPC⁄2015 (art. 982 do CPC⁄73), em havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial. Em exceção ao caput, o § 1° estabelece, sem restrição, que, se todos os interessados forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.
2. O Código Civil, por sua vez, autoriza expressamente,  independentemente da existência de testamento, que, "se os herdeiros forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura pública, termo nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo juiz" (art. 2.015). Por outro lado, determina que "será sempre judicial a partilha, se os herdeiros divergirem, assim como se algum deles for incapaz" (art. 2.016) – bastará, nesses casos, a homologação judicial posterior do acordado, nos termos do art. 659 do CPC.
3. Assim, de uma leitura sistemática do caput e do § 1° do art. 610 do CPC⁄2015, c⁄c os arts. 2.015 e 2.016 do CC⁄2002, mostra-se possível o inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que o testamento tenha sido previamente registrado judicialmente ou haja a expressa autorização do juízo competente.
4. A mens legis que autorizou o inventário extrajudicial foi justamente a de desafogar o Judiciário, afastando a via judicial de processos nos quais não se necessita da chancela judicial, assegurando solução mais célere e efetiva em relação ao interesse das partes. Deveras, o processo deve ser um meio, e não um entrave, para a realização do direito. Se a via judicial é prescindível, não há razoabilidade em proibir, na ausência de conflito de interesses, que herdeiros, maiores e capazes, socorram-se da via administrativa para dar efetividade a um testamento já tido como válido pela Justiça.
5. Na hipótese, quanto à parte disponível da herança, verifica-se que todos os herdeiros são maiores, com interesses harmoniosos e concordes, devidamente representados por advogado. Ademais, não há maiores complexidades decorrentes do testamento. Tanto a Fazenda estadual como o Ministério Público atuante junto ao Tribunal local concordaram com a medida. Somado a isso, o testamento público, outorgado em 2⁄3⁄2010 e lavrado no 18° Ofício de Notas da Comarca da Capital, foi devidamente aberto, processado e concluído perante a 2ª Vara de Órfãos e Sucessões.
6. Recurso especial provido.
VOTO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
2. Cinge-se a controvérsia em definir se é possível o processamento do inventário extrajudicial quando há testamento do falecido, notadamente em se tratando de interessados maiores, capazes e concordes, devidamente acompanhados de seus patronos.
O Tribunal de origem, por maioria, seguindo a interlocutória de piso, decidiu pela impossibilidade do inventário administrativo, pelos seguintes fundamentos:
Inicialmente, destaco ter sido designado como Relator no presente recurso, restado vencido o Des. Jessé Torres. Outrossim, destaco que os requisitos de admissibilidade já foram apreciados pelo Des. Relator, dispensando-se nova análise.
No caso em tela os recorrentes almejam dar cumprimento à ultima vontade da testadora quanto à partilha dos bens, procedendo os herdeiros a juntada da certidão do RGI do imóvel e dos contratos sociais das três empresas, não tendo havido até a presente data a nomeação de inventariante. Destacaram que ante a demora no trâmite judicial dos inventários referentes a apuração de haveres das cotas sociais das empresas inventariadas optaram por promover o inventário e a partilha dos bens pela via extrajudicial, com a finalidade de tornar mais célere o cumprimento de última vontade da testadora.
Entendo, em dissonância com o aduzido pelo Relator originário que resta inviável a pretensão dos recorrentes no sentido de procederem ao inventário pela via extrajudicial, haja vista a existência de disposição de última vontade do de cujus o que implica na aplicação do disposto no art. 610 do CPC, sendo certo que o § 1° do referido art. 610 não incide nos casos em que exista testamento, sendo esta a mens legis.
Diante do exposto, VOTO NO SENTIDO DE CONHECER O RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO, MANTENDO-SE A R. DECISÃO VERGASTADA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO SUPRA.
O voto vencido, por sua vez, asseverou que:
Cuida-se de agravo de instrumento deduzido nos autos de inventário em trâmite perante o Juízo da 2ª Vara de Órfãos e Sucessões da Comarca da Capital, contra decisão que indeferiu o processamento do inventário e da partilha de bens pela via extrajudicial, como requerido pelos herdeiros, ora agravantes.
A interlocutória hostilizada (pasta 29, anexo 1) rejeitou a pretensão nos seguintes termos:
[...]
Narram os agravantes que, no inventário judicial em trâmite, pretendem dar cumprimento à ultima vontade da testadora quanto à partilha dos bens, tendo procedido à juntada da certidão do RGI do imóvel e dos contratos sociais das três empresas, não tendo havido a nomeação de inventariante até a presente data.
Requereram a apuração de haveres das cotas sociais das empresas inventariadas, tendo o Juízo a quo determinado o processamento de cada qual separadamente, em três novos processos, distribuídos por dependência ao do inventário. Tendo em vista a demora no processamento de todas as demandas, e de serem os herdeiros maiores, capazes, representados pelos mesmos patronos, com interesses harmoniosos e concordes, postularam o processamento do inventário e da partilha de bens pela via extrajudicial, com a finalidade de tornar mais célere o cumprimento da última vontade da testadora. A decisão ora agravada indeferiu tal pleito e determinou o prosseguimento do inventário em sede judicial.
A Procuradoria de Justiça em atuação perante esta Corte opina pelo conhecimento e provimento do recurso (pasta 33), verbis:
"Agravo de Instrumento. Inventário. Testamento. Decisão agravada que indeferiu o pedido de realização do inventário e da partilha por instrumento público. Possibilidade de inventário pela via extrajudicial quando existir testamento. Interpretação do art. 610, §1°, do Código de Processo Civil. Enunciado 600 do CJF. Enunciado 16 do IBDF. Art. 297, §1°, da Consolidação Normativa da CGJ.
Parecer pelo conhecimento e provimento do recurso."
Com razão os agravantes.
O testamento público, outorgado aos 02.03.2010, foi aberto, processado e concluído perante o Juízo de Direito da 2ª Vara de Órfãos e Sucessões sob o n° 0132492-26.2015.8.19.0001 (pasta 106 do anexo 01). O inventário judicial (processo n° 0168997-16.2015.8.19.0001) encontra-se em fase de avaliação de bens e apuração de haveres. Dispõe o artigo 610, § 1°, do CPC ⁄15:
Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial.
§ 1° Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.
O Provimento n° 21⁄2017, da Corregedoria Geral de Justiça deste Estado, alterou o art. 297 da respectiva Consolidação Normativa, que passou à seguinte redação, verbis:
"Art. 297. A escritura pública de inventário e partilha conterá a qualificação completa do autor da herança; o regime de bens do casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário se houver; dia e lugar em que faleceu o autor da herança; data da expedição da certidão de óbito; livro, folha, número do termo e unidade de serviço em que consta o registro do óbito, além da menção ou declaração dos herdeiros de que o autor da herança não deixou testamento e outros herdeiros, sob as penas da lei.
§ 1. Diante da expressa autorização do juízo sucessório competente nos autos da apresentação e cumprimento de testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qua constituirá título hábil para o registro."
No mesmo sentido estabelecem o Enunciado n° 600, aprovado na VIII Jornada de Direito Civil, bem como o Enunciado n° 16, do Instituto Brasileiro de Direito da Família, ambos de 2015:
"Enunciado 600: Após registrado judicialmente o testamento e sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflitos de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial".
"Enunciado 16: Mesmo quando houver testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflitos de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial".
No caso em testilha, sendo todos os herdeiros maiores, capazes, representados pelos mesmos patronos, com interesses harmoniosos e concordes, a partilha de bens poderá ser feita por escritura pública em cartório extrajudicial, mediante acordo e expressa autorização do juízo sucessório. Averbem-se precedentes deste TJRJ, em casos de idêntico teor, de todo aqui aplicáveis, vg:
[...]
Daí votar por que se dê provimento ao recurso, para que seja autorizada a realização do inventário pela via extrajudicial, nos termos do art. 610, § 1°, do CPC⁄15.
3. Nesse passo, observo que o testamento é um negócio jurídico pelo qual a pessoa capaz faz disposições de caráter patrimonial ou extrapatrimonial, para depois de sua morte (CC, art. 1857), fazendo o testador amplo exercício de sua autonomia de vontade, seja quanto ao patrimônio seja em relação às questões existenciais, respeitados os limites da norma.
Com a morte, por meio da saisine, transmite-se a herança aos sucessores legítimos e testamentários, momento em que a universalidade de bens é definida em sua composição, por meio do inventário, bem como há a individualização da cota hereditária em relação a cada sucessor, por intermédio da partilha.
Nessa ordem de ideias, a Lei n. 11.441⁄2007, em normativo inovador, seguindo a linha da desjudicialização que atinge diversos países do mundo, autorizou a realização de alguns atos de jurisdição voluntária pela forma extrajudicial. A Resolução n. 35⁄2007, do CNJ, disciplinou especificamente o inventário e a partilha pela via administrativa, sem afastar, por óbvio, a via judicial, haja vista não se tratar de procedimento obrigatório.
Deveras, a partilha extrajudicial é instituto crescente e cada vez mais consagrado no direito comparado:
O Código Civil francês, artigo 819, prevê: "Si tous les héritiers sont présents et capables, le partage peut être fait dans la forme et par tel acte que les parties jugent convenables" ("Se todos os herdeiros estão presentes e são capazes, a partilha pode ser feita na forma e pelo ato que as partes julguem conveniente"). O Código Civil português, artigo 2.102,1, afirma que a partilha pode fazer-se extrajudicialmente, quando houver acordo de todos os interessados, ou por inventário judicial, nos termos previstos na lei do processo; a partilha extrajudicial deve ser feita por escritura pública se na herança existirem bens imóveis, como exige o Código do Notariado. O Código Civil espanhol, artigo 1.058, permite que a partilha da herança seja feita extrajudicialmente, se os herdeiros forem maiores, tiverem a livre administração de seus bens e houver acordo unanime {nemim discrepante) de todos eles. O artigo 3.462 do Código Civil argentino, reformado pela Lei n° 17.711⁄68, admite a partilha extrajudicial ou privada, que pode ser feita pelos herdeiros presentes e capazes, desde que haja acordo entre eles. Na Suíça, o artigo 607, 2, do Código Civil, estabelece o princípio da liberdade da convenção em matéria de partilha. No mesmo sentido: artigo 2.530 do Código Civil paraguaio; artigo 853 do Código Civil peruano; artigo 907,1, do Código Civil japonês; artigo 838, al. 1, do Código Civil de Québec. O artigo 2.048 do Código Civil alemão (BGB) e o artigo 733, II, do Código Civü italiano afirmam que o testador pode determinar que a partilha seja feita segundo o critério (que deve ser equitativo, justo) de um terceiro. (VELOSO, ZENO. Lei n° 11.441, de 04.01.2007 – Aspectos práticos da separação, divórcio, inventário e partilha consensuais. In: Família e responsabilidade. Coord. Rodrigo da Cunha Pereira. Porto Alegre: Magister⁄IBDFAM, 2010, p. 115)
O advento do novo Código de Processo Civil trouxe consigo a concretização de importantes mecanismos de pacificação, inclusive em relação às serventias extrajudiciais, enfatizando a desjudicialização da contenda.
Com relação especificamente ao inventário extrajudicial, o Código cristalizou o tema sem exauri-lo, definindo a escritura pública como o meio formal adequado ao seu processamento, equiparando-a "à sentença judicial quanto à sua eficácia executiva" (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 1025).
4. A dicção do art. 610 do CPC⁄2015 (art. 982 do CPC⁄73) é a seguinte:
Art. 610.  Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial.
§ 1o  Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.
§ 2o  O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
Em relação ao contexto da norma, ainda quando da entrada em vigor da Lei n. 11.441⁄2007, pontuou Zeno Veloso que:
Não há nenhum exagero ao afirmar que a Lei n° 11.441⁄07 é de extrema importância, introduziu um avanço notável, representa verdadeiro marco no Direito brasileiro, porque faculta aos interessados adotar um procedimento abreviado, simplificado, fora do Poder Judiciário, sem burocracia, sem intermináveis idas e vindas. O cidadão passou a ter razoável certeza do momento em que começa e da hora em que acaba o procedimento, a solução de seu problema. E isso é fundamental, sobretudo quando se trata de superar a crise dolorosa e aduda na relação familiar. (Lei n° 11.441, de 04.01.2007 – Aspectos práticos da separação, divórcio, inventário e partilha consensuais. In: Família e responsabilidade. Coord. Rodrigo da Cunha Pereira. Porto Alegre: Magister⁄IBDFAM, 2010, p. 103)
De fato, deve-se ter em mente que o norte interpretativo de todos os diplomas citados foi o de fomentar a utilização dos procedimentos com reflexos na ordem social, econômica e jurídica, diante das "reduções de burocracias e de formalidades para os atos de transmissão hereditária, bem como a celeridade, na linha da tendência atual de desjudicialização das contendas e pleitos" (TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito das sucessões, Vol. 6, Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 589).
Ademais, na linha do art. 5° da LINDB e dos arts. 3°, § 2°, 4° e 8° do novo CPC, os fins sociais e as exigências do bem comum em relação à norma autorizativa de inventário extrajudicial são a redução de formalidades e burocracias, com o incremento do maior número de procedimentos e de solução de controvérsias por meios alternativos ao aparato estatal.
Nesse contexto, havendo a morte e estando todos os herdeiros e interessados, maiores e capazes, de pleno e comum acordo quanto à destinação e partilha dos bens, não haverá necessidade de judicialização do inventário, podendo a partilha ser definida e formalizada conforme a livre vontade das partes no âmbito extrajudicial.
Foi autorizada, assim, a via extrajudicial do inventário mediante a lavratura de escritura pública, cujo pressuposto-base é a ausência de litigiosidade e que os envolvidos sejam capazes e estejam de acordo com a vontade manifestada pelo testador.
No entanto – e aqui reside a polêmica – a redação do dispositivo deixa margem à dúvida, que, no limite, pode inviabilizar o processamento do inventário extrajudicial quando há disposição de última vontade do de cujus. Penso que o só fato de existir testamento não pode ser impeditivo para que o inventário siga pela via administrativa.
Data venia, não parece razoável obstar a realização do inventário e da partilha por escritura pública quando há registro judicial do testamento (já que haverá definição precisa dos seus termos) ou autorização do juízo sucessório (ao constatar que inexistem discussões incidentais que não possam ser dirimidas na via administrativa), sob pena de violação a princípios caros de justiça, como a efetividade da tutela jurisdicional e a razoável duração do processo.
Decorrente da própria técnica legislativa, o caput do dispositivo de lei deve ser tido como o responsável pela ideia central do artigo, cabendo aos parágrafos a definição dos seus desdobramentos, explicações, complementações, condições e exceções à cabeça do dispositivo.
Com efeito, "os parágrafos têm por finalidade explicar ou modificar a regra constante do artigo ao qual se submetem. Possuem função de escrita secundária e não devem estabelecer regra geral. As alíneas, incisos e itens devem ter apenas uma função esclarecedora ou enunciativa" (VENOSA, Sílvio de Salvo. Introdução ao estudo do direito: primeiras linhas. São Paulo: Atlas, 2006, p. 209).
Nessa ordem de ideias, o caput do art. 610 estabelece a regra: em havendo testamento ou interessado incapaz, o inventário se dará pela via judicial. Não obstante, conforme exceção à regra disposta no § 1°, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública sempre que os herdeiros forem capazes e concordes e não façam nenhuma restrição, o que engloba, por óbvio, a situação em que exista testamento.
Ademais, o Código Civil autoriza expressamente,  independentemente da existência de testamento, que, "se os herdeiros forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura pública, termo nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo juiz" (art. 2.015). Por outro lado, determina que "será sempre judicial a partilha, se os herdeiros divergirem, assim como se algum deles for incapaz" (art. 2.016). Bastará, nesses casos, a homologação judicial posterior do acordado, nos termos do art. 659 do CPC.
Aliás, importante destacar que, antes mesmo da Lei n. 11.441⁄2007, o notário já lavrava escrituras públicas de partilha amigável, ainda que houvesse testamento, desde que a escritura fosse submetida à homologação do juiz.
É o destaque da doutrina:
De modo que, se antes da vigência da lei era possível a prática do ato notarial, não há razão para sustentar que desde o dia 5 de janeiro de 2007 não é mais possível a realização de inventário e partilha por escritura pública quando houver testamento, devendo ficar a ressalva de que, nesses casos, a escritura precisa ser homologada judicialmente. Interpretar de outro modo seria até mesmo absurdo, pois, nesse caso, o notário teria competência legal exclusiva para elaborar o testamento público e não poderia elaborar a escritura pública de partilha. (CAHALI, Francisco José [et al.]. Escrituras públicas: separação, divórcio, inventário e partilha consensuais. São Paulo: RT, 2008, p. 66).
Assim, a mens legis que autorizou o inventário extrajudicial foi justamente a de desafogar o Judiciário, afastando a via judicial de processos nos quais não se necessita da chancela judicial, assegurando solução mais célere e efetiva em relação ao interesse das partes.
Realmente, "entre maiores e capazes que se acham em pleno acordo quanto ao modo de partilhar o acervo hereditário, nada recomenda ou justifica o recurso ao processo judicial e a submissão a seus custos, sua complexidade e sua inevitável demora. Por outro lado, a retirada do inventário da esfera judicial contribui para aliviar a justiça de uma sobrecarga significativa de processos. Essa sistemática, portanto, só merece aplausos" (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, v. 2, Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 257).
Por óbvio, sempre será possível a discussão judicial de eventuais controvérsias a respeito da validade do testamento ou de alguma de suas cláusulas. Da mesma forma, "a existência de débitos do autor da herança, bem como de eventual direito de terceiros, não impedem a lavratura da escritura pública amigável de inventário e partilha. Contudo, ficam ressalvados esses eventuais direitos porque o sistema jurídico brasileiro não admite sejam realizados negócios jurídicos em fraude contra credores, que ficam sujeitos à anulação (CC 158), nem em fraude de execução, que são ineficazes relativamente à ação judicial pendente quando da alienação ou oneração do bem (CPC, 792)" (NERY JR. Nelson. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 1.432).
Nessa esteira, "todo testamento, para o seu cumprimento, deve, antes de mais nada, ser registrado em juízo, ou seja, em processo judicial específico, regulado pelos arts. 1.225 a 1.129 do Código de Processo Civil de 1973 (arts. 735 a 737 do CPC de 2015)".
Deveras, o inventário extrajudicial com testamento exige o provimento judicial para o ato de abertura, registro e cumprimento de testamento. "Nesse ato de abertura e registro de testamento, que é judicial, possíveis vícios formais serão apreciados e o testamento somente será executado se atender os requisitos formais. Assim, de um modo ou de outro, o inventário extrajudicial somente poderá ser iniciado após o registro do testamento e da ordem de cumprimento em processo judicial específico" (FIGUEIREDO, Ivanildo. Inventário extrajudicial na sucessão testamentária: possibilidade, legalidade, alcance e eficácia. Revista Nacional de Direito de Família e Sucessões n. 8 - set.⁄out.⁄2015, pp. 97-98).
No mesmo sentido, é a lição de Cristiano Chaves:
Todavia, em proibição pouco coerente, a legislação não admite o uso da via administrativa de inventário se o falecido deixou testamento. Nesse caso, imperativo o manejo de inventário em juízo, por conta da necessidade de prévia homologação do testamento. O argumento não convence. Ora, o que se mostra necessário proceder em juízo é a homologação do testamento. Assim, se o testamento já foi homologado judicialmente, garantida está a sua idoneidade, não se vislumbra qualquer óbice a impedir a partilha amigável, entre capazes, pela via cartorária. Injustificável, portanto, a vedação. (Curso de direito civil: sucessões. Salvador: Juspodvm, 2016, p. 518)
De outra parte, o processamento do inventário extrajudicial sempre exigirá a assistência e o acompanhamento de advogado ou defensor público. Com efeito, não obstante o testamento, "o inventário extrajudicial exige a concordância de todos os interessados com os termos da partilha dos bens, os quais devem ser assistidos pelos seus advogados, garantia de segurança quanto ao conhecimento dos direitos e obrigações de cada um" (ARAÚJO, Luciano Vianna. Comentários ao Código de Processo Civil. Coord. Cassio Scarpinella Bueno. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 178).
Em se tratando de direitos disponíveis, não há razão de ordem pública para proibir o inventário extrajudicial quando o testamento já tiver sido homologado judicialmente, até porque o herdeiro maior e capaz nem sequer é obrigado a receber o seu quinhão hereditário estipulado pelo testador.
Ainda porque, ao lavrar o testamento – ato solene por natureza –, o notário o faz com a observância de todas as suas formalidades, sendo efetivado na presença do testador e de duas testemunhas, discutido, lido, escrito e assinado no livro de notas, com a certeza e a segurança de assim representar a vontade manifestada pelo testador (CC, art. 1.864), além do absoluto cuidado e elevado grau de segurança na qualificação do testador, na aferição da sua capacidade e do seu discernimento, na limitação do seu poder de disposição, com respeito, inclusive, à legítima dos herdeiros necessários (CC, art. 1.857, § 1º).
A doutrina bem destaca a atuação do referido profissional:
O tabelião, ao colher a declaração de vontade e lavrar o testamento, representa o principal agente formalizador do ato, como titular da fé pública. Não serão as testemunhas instrumentárias que poderão, futuramente, comprovar ou afirmar a existência real do ato de testamento lavrado no cartório de notas, perante o tabelião. Tampouco o Juiz ou o representante do Ministério Público poderão expressar a vontade do testador em vida, visto que sequer conheceram a pessoa do testador. A responsabilidade pela certeza e pela perfeição jurídica do testamento é do tabelião, cujo instrumento lavrado vai assegurar a perpetuação da vontade do testador após a sua morte.
Todavia, o tabelião conheceu e teve contato direto com o testador, quando este expressou sua vontade testamentária para dispor dos seus bens e interesses, instituindo condições especiais e particulares para o processamento da sua sucessão. Coube ao tabelião, nesse contato personalíssimo com o testador, conversar, discutir e esclarecer os requisitos estabelecidos em lei para o ato de testar, explicando sobre a limitação do poder de disposição, esclarecendo a respeito da intangibilidade da legítima dos herdeiros necessários. Assim, ainda que o inventário extrajudicial venha a ser processado, no futuro, por outro tabelião que não tenha lavrado o testamento, os critérios de elaboração e formalização do testamento adotados foram os mesmos, o grau de segurança jurídica esteve garantido pelo cumprimento de todas as solenidades definidas e exigidas no art. 1.864 do Código Civil. (FIGUEIREDO, Ivanildo. ob.cit., p. 95-96).
5. Assim, de uma leitura sistemática do caput e do § 1° do art. 610, do CPC⁄2015, penso ser possível o inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que o testamento tenha sido previamente registrado judicialmente ou haja a expressa autorização do juízo competente .
Com efeito, penso que a só existência de testamento não pode servir de motivo para impedir que o inventário seja levado a efeito administrativamente. "Não existindo litígio ou conflito de interesses, sendo todas as partes maiores e capazes, nada mais justifica, pois, que tais questões continuem a ser levadas ao Poder Judiciário, que, na maioria desses casos, terá sua função limitada a mero papel homologatório, de chancelar aquilo que já foi decidido pela livre-vontade das partes" (FIGUEIREDO, Ivanildo. ob.cit., p. 90).
Ora, o processo deve ser um meio, e não um entrave, para a realização do direito. Se a via judicial é prescindível, não há razoabilidade em proibir, na ausência de conflito de interesses, que herdeiros, maiores e capazes, socorram-se da via administrativa para dar efetividade a um testamento já tido como válido pela Justiça.
Trata-se, aliás, do posicionamento amplamente aceito pela doutrina e pela jurisprudência, na dicção de diversos enunciados e provimentos das Corregedorias dos Tribunais. Confira-se:
– Enunciado n. 600 da VII Jornada de Direito Civil do CJF: "Após registrado judicialmente o testamento e sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial."
– Enunciado n. 77 da I Jornada sobre Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios: "Havendo registro ou expressa autorização do juízo sucessório competente, nos autos do procedimento de abertura e cumprimento de testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes, o inventário e partilha poderão ser feitos por escritura pública, mediante acordo dos interessados, como forma de pôr fim ao procedimento judicial."
– Enunciado n. 51 da I Jornada de Direito Processual Civil do CJF: "Havendo registro judicial ou autorização expressa do juízo sucessório competente, nos autos do procedimento de abertura, registro e cumprimento de testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes, poderão ser feitos o inventário e a partilha por escritura pública."
– Enunciado n. 16 do IBDFAM: "Mesmo quando houver testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial."
Ademais, já é a realidade adotada pelas Corregedorias dos Tribunais do país, que vêm autorizando o inventário extrajudicial, ainda que presente disposição de última vontade (testamento), desde que os interessados sejam capazes e concordes, como soem, por exemplo, as determinações do TJSP (Provimento n. 37 da Corregedoria-Geral), do TJRJ (nova redação do art. 297, § 1°, da Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral - Provimento n. 21⁄2017), do TJPB (art. 310 do Código Geral de Normas Judicial e Extrajudicial da Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba) e do TJPR (Ofício-circular 155⁄2018 da Corregedoria da Justiça do Paraná).
Também é o entendimento da doutrina especializada:
Se houver testamento com conteúdo patrimonial, pode-se fazer partilha por escritura pública se herdeiros forem capazes, seguida de homologação judicial. É possível o inventário extrajudicial ainda que haja testamento, desde que previamente registrado em juízo ou homologado posteriormente pelo juízo competente (Enunciado n. 1 do Colégio Notarial do Brasil) [...] Realmente, a existência de testamento não deveria coibir inventário extrajudicial, desde que haja: a) homologação judicial do ato de última vontade; b) plena capacidade dos herdeiros; c) ausência de conflito entre os interessados; e d) invocação da cláusula geral de negócios processuais atípicos (CPC, art. 190). (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: vol. 6: direito das sucessões. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 446)
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Com o devido respeito, os diplomas legais que exigem a inexistência de testamento para que a via administrativa do inventário seja possível devem ser mitigados, especialmente nos casos em que os herdeiros são maiores, capazes e concordam com esse caminho facilitado. Nos termos do art. 5° da Lei de Introdução, o fim social da Lei 11.441⁄2007 foi a redução de formalidades, devendo essa sua finalidade sempre guiar o intérprete do Direito. O mesmo deve ser dito quanto ao Novo CPC, inspirado pelas máximas de desjudicialização e de celeridade. (TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito das sucessões, Vol. 6, Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 548)
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Nos termos da Lei n° 11.441⁄07, o inventário e partilha por escritura pública só podem ser feitos se todos os interessados forem capazes e concordes, devendo estar assistidos por advogado. Mas a utilização deste expediente, extrajudicial, não pode ocorrer se o falecido deixou testamento. Não importa a forma do testamento – ordinário ou especial – ou da natureza das disposições testamentárias, ou de o testamento já ter sido registrado ou confimado em juízo e com o 'cumpra-se' do juiz (CPC, arts. 1.125 a 1.134). Dada a expressa vedação legal, não há como fugir à conclusão de que a existência do testamento impede a utilização da partilha extrajudicial. Mas, se os herdeiros forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura pública, na forma do art. 2.015 do Código Civil, mesmo que o autor da herança tenha deixado testamento, todavia, como prevê o art. 1.0131 do CPC [art. 659 do novo CPC] – com a redação dada pelo art. 2° da Lei n° 11.441⁄07 –, a partilha, neste caso, tem de ser homologada pelo juiz. Entretanto, o falecido pode ter morrido sem testamento, mas ter deixado um codicilo (Código Civil, art. 1.881), que é disposição de última vontade, de conteúdo e objeto limitados, e testamento não é. Penso que, neste caso, é possível fazer-se a partilha extrajudicial, por escritura pública. (cf. Juliana da Fonseca Bonates, Separação, divórcio, partilhas e inventários extrajudiciais, coordenadores Antônio Carlos Mathias Coltro e Mário Luiz Delgado, São Paulo: Editora Método,

007, p. 318). (VELOSO, ZENO. Lei n° 11.441, de 04.01.2007 – Aspectos práticos da separação, divórcio, inventário e partilha consensuais. In: Família e responsabilidade. Coord. Rodrigo da Cunha Pereira. Porto Alegre: Magister⁄IBDFAM, 2010, p. 114)
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Unicamente quando da existência de testamento, ou de incapazes, ou de falta de acordo, é obrigatória a via judicial. Na existência de testamento, entretanto, passou a entender-se a possibilidade da escritura pública, bastando, em passo posterior, a mera homologação do juiz. (RIZZARDO, Arnaldo. Direito das sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 604)

Não se pode olvidar que a partilha amigável feita pelos serviços notariais e registrais, além de aprimorar a justiça colaborativa, permite que o jurisdicionado e os advogados tenham "um ambiente com acessibilidade e segurança jurídica, além de baixo custo e celeridade" (SILVA, Érica Barbosa e. O novo CPC e o inventário extrajudicial - uma análise crítica. Revista Nacional de Direito de Família e Sucessões n. 10 - jan.⁄fev.⁄2016, p. 201).
6. No caso dos autos, quanto à parte disponível da herança, verifica-se que todos os herdeiros são maiores, com interesses harmoniosos e concordes, devidamente representados por advogado. De resto, não há maiores complexidades decorrentes do testamento, já que, "conforme disposto no testamento de fls. 101⁄103 do anexo, é importante destacar que a falecida legou a parte disponível de todos os bens que possui ou venha possuir para seu marido Samuel Cukierman, incluindo nesta parte, as ações do Centro de Correção Ocular Ltda., dos Serviços Médicos Oftalmológicos Ltda., e as ações do Pro-Oftalmo MicroCirurgia Ocular, e que a legítima de seus filhos Rogério e Mauro deverá recair na parte que a testadora possui no imóvel na Rua Marechal Taumaturgo n° 205 casa 1, Teresópolis" (fl. 39).
Tanto a Fazenda Estadual como o Ministério Público atuante junto ao Tribunal local concordaram com a medida.
Somado a isso, o testamento público, outorgado em 2⁄3⁄2010, lavrado no 18° Ofício de Notas da Comarca da Capital, folhas 199⁄200, Livro 76T, foi devidamente aberto, processado e concluído perante a 2ª Vara de Órfãos e Sucessões sob o n. 0132492-26.2015.8.19.0001.
Portanto, segundo penso, não há razão para indeferir o processamento do inventário extrajudicial.
7. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para autorizar que o inventário dos recorrentes ocorra pela via extrajudicial.
É o voto.
Documento: 101799779          RELATÓRIO, EMENTA E VOTO       

quarta-feira, fevereiro 12, 2020

Não caracterização. Incidência de IPTU sobre imóvel particular situado integralmente em unidade de conservação integral.



STJ - Tributário. IPTU. Meio ambiente. Unidade de conservação integral. Processo civil e tributário. Recurso especial. Enunciado Administrativo 3/STJ. Ofensa ao CPC/2015, art. 489, § 1º, VI, «e», CPC/2015, art. 1.022, II. Não caracterização. Incidência de IPTU sobre imóvel particular situado integralmente em unidade de conservação integral. Estação ecológica. Limitação administrativo no caso concreto que impõe restrição do proprietário ao exercício do domínio útil. Não caracterização da hipótese de incidência do CTN, art. 34. Área considerada rural. Não cabimento de IPTU, mas itr. Competência tributária exclusiva da União. Recurso especial parcialmente provido. Lei 9.985/2000, art. 9º, § 1º. Lei 9.985/2000, art. 49
«1 - Não se configura a alegada ofensa aos CPC/2015, art. 489 e CPC/2015, art. 1.022, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide, fundamentando seu proceder de acordo com os fatos apresentados e com a interpretação dos regramentos legais que entendeu aplicáveis, demonstrando as razões de seu convencimento.
2 - Trata-se de embargos à execução fiscal manejados pelo contribuinte que visa desconstituir o IPTU exigido pela Município de Belo Horizonte, sobre imóvel situado em Unidade de Conservação, designada de Estação Ecológica Cercadinho, instituída pela Lei Estadual 15.979/2006.
3 - A limitação administrativa imposta pela Lei 9.985/2000 acarreta ao particular, o esvaziamento completo dos atributos inerente à propriedade, de reivindicação, disposição, de uso e gozo do bem, retirando-lhe na hipótese o domínio útil do imóvel, de modo que o aspecto subjetivo da hipótese de incidência do IPTU, disposto no CTN, art. 34, não se subsume à situação descrita neste autos, razão pela qual não se prospera a incidência do referido tributo.
4 - Ademais, a Lei 9.985/2000, art. 49 assevera que a área de uma unidade de conservação de proteção integral é considerada zona rural para efeitos legais, motivo pelo qual, não se cogitaria a incidência de IPTU sobre o referido imóvel descritos nos autos, mas de ITR, sendo este último tributo de competência tributária exclusiva da União, não se prosperando a manutenção do Município como sujeito ativo da relação tributária.
5 - Recurso Especial conhecido e parcialmente provido.»
(STJ (2ª T.) - Rec. Esp. 1.695.340 - MG - Rel.: Min. Mauro Campbell Marques - J. em 17/09/2019 - DJ 24/09/2019)

domingo, dezembro 08, 2019

Negligência paterna - TJ-SP condena pai a indenizar filha em R$ 30 mil por abandono afetivo




Com base em provas testemunhais e um laudo psicossocial que atestou a negligência, a 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um pai por abandono afetivo de sua filha. A reparação foi fixada em R$ 30 mil, a título de danos morais.


"A indenização por danos morais é adequada para compensar o dano suportado no caso em tela, observada ainda sua finalidade pedagógica", afirmou o relator, desembargador Dácio Tadeu Viviani Nicolau. Ele foi acompanhado pelos demais integrantes da turma julgadora.


A autora, menor de idade representada nos autos pela mãe, tem Síndrome de Asperger, um dos transtornos do espectro do autismo caracterizado por dificuldades na interação social e na comunicação, além de interesses restritos e comportamentos repetitivos. A mãe alega que a ausência paterna acarretou grande sofrimento à criança, pois o réu se omitiu de prover companhia e afeto por muitos anos, "tratando a filha com desprezo e de forma distinta de seu outro filho".


Na sentença de primeiro grau, o juiz da 2ª Vara de Família e Sucessões de São Carlos, Caio Cesar Melluso, ressaltou que “não se trata de indenizar a mera falha moral do pai ou do cônjuge ou companheiro no direito de família, mas sim de proteger a dignidade da pessoa humana, seja esta parental, convivente, casada ou não”, afirmou.


O pai recorreu ao TJ-SP, mas a sentença foi mantida. Para o relator, a filha “não busca reparação por desamor do genitor, mas sim em decorrência de negligência caracterizada pela inobservância de deveres de convívio e cuidado que fazem parte do poder familiar e que consistem em expressão objetiva do afeto”. Com informações da assessoria de imprensa do TJ-SP.



Revista Consultor Jurídico, 8 de dezembro de 2019, 11h35


TJPR exclui condenação por dano moral decorrente de “infidelidade virtual”

No 1º Grau de Jurisdição, indenização foi fixada em R$ 30 mil Seg, 29 Jun 2020 12:41:28 -0300 Em uma ação de divórcio, além da resolução de ...