RECURSOS ADMINISTRATIVOS
Recursos
administrativos são postulações apresentadas pelos administrados ou servidor perante
autoridade com poder de decisão interna, sobre determinado assunto, no sentido
de reexaminar o ato produzido pela própria administração.
O recurso administrativo
é a amplitude democrática mostrada na revisão de uma decisão administrativa, impedindo
que a decisão proferida seja única e irrecorrível. Em atividade que pode ser
denominada de parajudicial a
Administração Pública, possui, dentro de seu exercício jurisdicional
administrativo, instâncias inferiores e superiores.
Os efeitos dos
recursos interpostos podem ser suspensivo
ou devolutivo. Neste a matéria será
devolvida para a autoridade que detém a competência para a decisão a respeito do
processo. Esse é o efeito normal de todo recurso. O suspensivo, cuja existência depende de lei expressa, suspenderá os
efeitos da decisão até que outra decisão seja proferida. Quando a lei não
estabelece o efeito do recurso considera-se somente no devolutivo. No recurso com efeito suspensivo acontecem duas
fundamentais consequências: a interrupção da prescrição e o impedimento de ação
judicial para enfrentamento judicial da decisão em sede recursal. Enquanto
perdurar o recurso com efeito suspensivo não corre a prescrição e a
impossibilidade de proposta de ação judicial para dirimir o conflito ainda
pendente de decisão administrativa. Tudo isso por ser ainda possível de, no
recurso administrativo, a autoridade administrativa modificar a decisão
corrigindo o ato.
O art. 5º da
Constituição Federal, em seus incisos XXXIV e LV, estabelece o duplo efeito aos
recursos.
O democrático
sistema de recursos administrativo atinge a todos assegurando, independente de
taxas, “o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou
contra ilegalidade ou abuso de poder (letra a, inciso XXXIV, do art. 5º) e de
obter “certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e
esclarecimento de situações de interesse pessoal” (letra b).
Não se permite
ainda, o cerceamento de defesa a quem postula em processos administrativos e
judicial, portanto o disposto no inciso LV do art. 5º da CF, impõe que assegure
aos “litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral”, o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Portanto, o
objetivo do recurso é o da revisão, reforma ou alteração de decisão
administrativa que o interessado entende ser ilegal ou não atende aos
interesses públicos.
Os recursos
administrativos são manejados por meios formais fundados no direito de petição,
podendo ser voluntário, quando interposto por particular; e os hierárquicos quando
proposto por autoridade inferior, estes chamados os recursos de ofícios.
Alguns autores classificam
os recursos em hierárquicos próprios e impróprios.
Os recursos
hierárquicos próprios são os que tramitam somente na via interna dos órgãos ou
das pessoas administrativas, como o chefe da divisão recorre de uma decisão ao
seu superior, diretor do departamento em que exerce suas funções. Neles não
existem previsões na legislação positiva, nascem do próprio controle afeto à
Administração Pública. Importante salientar que nada impede que, interposto
este recurso, o superior hierárquico possa decidir além do pedido, pois no caso
o que determina a revisão é o interesse público envolvido e o poder de
autotutela, que devem prevalecer. Podendo, quando afetar algum administrado,
decidindo até pela reformatio in pejus
(ver), no caso dando oportunidade de
defesa.
Os impróprios são
aqueles que tramitam entre órgãos estranhos aos de onde originou-se o ato que
está sendo questionado no recurso. É impróprio justamente porque não existe
relação e nem subordinação hierárquica entre o órgão controlador e o
controlado. São recursos que sempre depende que uma legislação estabeleça os
parâmetros de sua existência. No entanto é de boa justiça a autoridade
administrativa rever, em recurso, mesmo que não haja previsão legal, pois o
cerceamento de defesa será flagrante se houver, nas motivações e razões do
recurso, lesões aos direitos que se pretende proteger.
Em alguns casos é
possível a intervenção de terceiros no processo administrativo, ou até mesmo em
recursos interpostos. Dependendo, essa intervenção, se há interesses de
terceiros sendo violados, tanto pela Administração Pública quanto por
administrado.
O inc. II, do
art. 9º, da Lei 9.784/99, determina que estarão legitimados a intervir no
processo administrativo “aqueles que, sem terem iniciado o processo, têm
direitos ou interesses que possam ser afetados pela decisão a ser adotada”, ou
seja, é interessado sem relação inicial com o processo ou recurso
administrativo. Também, o art. 62 da mesma lei obriga o poder público, quando
interposto recurso, a intimar interessados para apresentar alegações, se
tiverem, no prazo de cinco dias.
Pode ocorrer de
processo administrativo em curso, ainda em trâmite, e ser interposto recurso incidental para dirimir
questões oriundas de decisões que culminam com outra.
Questiona-se,
também, se um Poder pode interpor recurso em face de outro. Não é possível em
vista do disposto no art. 2º da CF que determina a independência e harmonia
entre eles.
Sobre a
nomenclatura que deve ser utilizada nos processos administrativos vigora no
direito brasileiro o princípio do formalismo moderado, ou seja, a legislação
não exige a formalidade de um processo civil. Na prática pode ser utilizada expressões
genéricas, pois não pode retirar a natureza revisional do pedido.
A doutrina estabelece
algumas nomenclaturas cujo interesse é a de estabelecer um método de organização,
como a representação, reclamação, pedido de reconsideração e revisão.
Representação
A representação é assim denominada por ser
meio pelo qual alguém relata, formalizando em forma de denúncia, irregularidades
ou condutas abusivas praticadas por agentes da Administração Pública. Na
representação apresentada para autoridade superior àquela denunciada, deve
conter o pedido de apuração e a penalidade a ser aplicada. O fundamento legal está
disposto na Lei 4.898/65 que trata da representação contra abuso de autoridade.
O art. 74, §2º da
CF cuida, como forma de controle, da legitimidade em denunciar irregularidades
ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas, estabelecendo que “qualquer
cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima” para a
formalização da representação.
Quando recebida a
representação a autoridade administrativa tem a obrigação de providenciar
imediatamente a apuração dos fatos tidos como lesivos à Administração Pública.
A obrigação em abrir processo administrativo pode ser tanto internamente quanto
apuração de fatos que não sejam internos.
Reclamação Administrativa
A reclamação administrativa, outra
modalidade de recurso administrativo, está prevista no Decreto 20.910/32,
quando a estabelece em seu art. 6º.
A legislação ao
criar a reclamação administrativa inseriu-a dentre as modalidades de recurso no
qual quem tem legitimidade para a propositura da reclamação é somente aquele
que tem interesse legitimo por estar sofrendo diretamente, por atos da
Administração Pública, lesões em seus direitos. As pessoas que podem reclamar
são tanto as físicas quanto as pessoas jurídicas.
A Administração
Pública, ao receber a reclamação, deve observar que o prazo para a sua
interposição é de um ano a contar do ato ou fato lesivo. No entanto, movida por
interesse público, a Administração ao perceber que o recurso é intempestivo
tendo o administrado decaído do direito, poderá conhecer do pedido e dar
procedência para o trâmite processual. No entanto, necessário que o prazo
judicial não tenha ainda prescrito e que, ao analisar o pedido, a Administração
Pública tenha plena ciência de que o pleito poderá ser procedente
judicialmente. Caso contrário não haveria possibilidades de procedência do
pedido. Ainda, se a reclamação apresentada puder afetar os direitos de outrem,
não poderá receber a reclamação se já houve a prescrição
do
prazo estabelecido no art. 6º do Decreto 20.910.
Por outro lado, o
art. 4º, do diploma legal, estabelece a suspensão
da prescrição enquanto existente a demora na resolução do caso e o marco
inicial para a suspensão é da entrada do requerimento do titular do direito ou
do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas (parágrafo único).
O §3º do art.
103-A, da CF, estabelece que “do ato administrativo ou decisão judicial que
contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação
ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato
administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra
seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso".
O art. 103-A é
regulamentado pela Lei 11.417/06, que dispõe em seu art. 7º, a possibilidade de
apresentar reclamação ao Supremo Tribunal Federal, quando a decisão judicial ou
do ato administrativo contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe
vigência ou aplicá-lo indevidamente. Evidente que a reclamação não impede
outros meios admissíveis de impugnação.
No caso da Lei
11.417/06, a reclamação, nos casos de omissão ou ato da administração, somente
será possível quando ocorrer o esgotamento das vias administrativas e, se
procedente a reclamação, o “Supremo Tribunal Federal anulará o ato
administrativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra
seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso” (art. 7º, §2º).
Pedido de Reconsideração
O pedido de reconsideração é recurso
administrativo dirigido a mesma autoridade que praticou o ato que se pretende
anular ou de revisão dos seus termos expostos. Basta que o recurso seja
remanejado para a mesma autoridade expedidora do ato que já pode ser
considerado pedido de reconsideração, pois não há previsão legal para sua
existência. Deve ser considerado o pedido de reconsideração apenas uma vez,
deferido ou indeferido. Caso o interessado não consiga o intento não poderá
apresentar novo pedido, podendo se socorrer em outras instâncias, mas não mais
a reconsideração, pois não existe reconsideração
de reconsideração.
Para que tal
recurso não perdure no tempo há entendimentos doutrinários que o prazo será de
até um ano, da data da decisão. Importante salientar que a sua impetração não
interrompe e nem suspende a prescrição. A súmula 430 do STF consolidou tal
entendimento ao proclamar que o “pedido de reconsideração na via administrativa
não interrompe o prazo para o mandado de segurança”.
O §1º do art. 56
da Lei 9.784/99, dá o prazo de cinco dias ao administrador público para
proferir a decisão, caso não a reconsidere deve encaminhar à autoridade
superior para que aprecie imediatamente.
O §4º do art. 109
da Lei 8.666/93, estabelece o prazo de cinco dias úteis para a autoridade
reconsiderar a sua decisão, ou, no mesmo prazo, deverá fazer o recurso subir a
superior instância administrativa com todas as informações necessárias, sob
pena de responsabilidade. O mesmo artigo, no §5º, impede que a análise do
pedido de reconsideração tenha início sem que o processo esteja na repartição
pública, ou seja, se o processo estiver com vistas franqueadas ao interessado,
não poderá ocorrer a análise do pedido.
Revisão
O pedido
administrativo de revisão é recurso apresentado frente à Administração Pública onde
o interessado requer o reexame de uma decisão cujo resultado foi imposta uma
sanção proferida em processo administrativo.
O pressuposto de
conhecimento do recurso, a qualquer tempo, é quando surgirem fatos novos ou
circunstâncias relevantes que são suscetíveis de justificar a inadequação da
sanção aplicada (art. 65 da Lei 9.784/99). A decisão do pedido de revisão não
poderá agravar a situação do requerente, ou seja, não poderá ser reformatio in pejus. O pedido de revisão
tem caráter de recurso, segundo disposto no art. 174 e seguintes da Lei
8.112/90.
No processo
administrativo, principalmente no tocante ao recurso, não há exagero no
formalismo de seu trâmite. Exige-se, sim, que se cumpram determinadas
formalidades/formas para evitar se imponham sanções ilegais e estabeleçam
direitos inexistentes ou na restrição dos direitos.
Esse princípio
adotado como formalismo moderado,
objetiva a facilitação de atuação do administrado, com o desiderato de ampliar
o contraditório e a ampla defesa, com eliminação das formalidades
desnecessárias, dispensando-se formas rígidas sempre em benefício do
administrado e da Administração.
Para a garantia
de admissibilidade na interposição dos recursos administrativos alguns entendem
necessário depósito prévio. O §2º do art. 56 da Lei 9.784/99, determina que
“salvo exigência legal, a interposição de recurso administrativo independe de
caução”, ou seja, se não existir previsão legal, não é necessária a exigência
de caução
.
No caso da lei
exigir o depósito de valor, determinando uma caução, o recurso somente poderá
ser recebido mediante o depósito, tal exigência não configura cerceamento de
defesa ou ofensa aos princípios da ampla defesa ou contraditório, pois já havia
prévia previsão
.
Por preservar os
interesses públicos a Lei 9.784/99 permitiu que o Administrador Público, diante
de um recurso possa confirmar, modificar, anular ou revogar, total ou
parcialmente, a decisão recorrida (art. 64), no entanto, se da “aplicação do
disposto neste artigo puder decorrer gravame à situação do recorrente, este
deverá ser cientificado para que formule suas alegações antes da decisão”
(parágrafo único), permitindo, assim, que dentre as reformas da decisão possa a
mesma agravar a situação do administrado, aplicando-se a reformatio in pejus.
A existência de divergências
a respeito da aplicação desse princípio se funda no critério para aplicação da
pena mais grave, que deve ser o objetivo. Não pode o Administrador Público, por
critérios subjetivos ou por discricionariedade, procurar agravar a situação do
administrado no recurso interposto. Exemplo é a aplicação de pena ao servidor. Se
a pena aplicada é a A e a lei determinava a B, por ser reincidente, pode a
autoridade pública receber e negar seguimento ao recurso e corrigir o ato
punitivo com a substituição da pena A pela B
.
No RE
n. 160.616/CE, o STJ decidiu que a prova do depósito da multa é condição para o
recebimento
do recurso administrativo.
Exemplo fornecido por Carvalho Filho
in Manual de Direito Administrativo, p. 951, Ed. 2012.