sábado, dezembro 03, 2011

Direito Administrativo Brasileiro - Breves conceitos

POLÍCIA ADMINISTRATIVA

A doutrina tem definido polícia como “um conjunto de poderes estatais coercitivos exercido, in concreto, pelo Estado sobre as atividades dos administrados, através de medidas restritivas, impostas a essas atividades, a fim de assegurar-se a ordem pública[1]”. Para que a Administração Pública possa exercer seus poderes e fazer cumprir as leis que emanam de seu império, necessário se faz a força concreta sobre todos os que se encontram sob seu domínio. Essa supremacia sobre o todo é exercida pela polícia administrativa, que limita administrativamente a ação do particular em proteção à coletividade, obedecendo imposições legais tais como ordens, notificações, licenças, alvarás, autorizações, sanções etc. Esse é o verdadeiro fundamento da polícia administrativa, ou seja, uma executora das leis emanadas pela administração pública como poder-dever. A polícia judiciária, já diferenciando da polícia administrativa é a que pratica a repressão em atendimento aos ditames do Poder Judiciário. Essa dicotomia polícia administrativa e polícia judiciária é feita há tempos pela doutrina. A primeira é atividade desenvolvida para o exercício das funções administrativas na fiscalização, prevenção e repressão e também na aplicação das sanções administrativas. Já a polícia judiciária é aquela que possui o poder de apurar as infrações penais (crimes e contravenções), capturando delinquentes, com apoio no aparato policial, com o regime jurídico do direito processual penal. O regime jurídico da polícia administrativa é o administrativo. Para Maria Sylvia Z. DI PIETRO, “a principal diferença que se costuma apontar entre as duas está no caráter preventivo da polícia administrativa e no repressivo da polícia judiciária. A primeira terá como objetivo impedir as ações antissociais, e a segunda, punir os infratores da lei penal”[2]. No entanto continua lecionando para dize que a diferença não é absoluta, ao contrário, a polícia administrativa também pode agir preventivamente e repressivamente. A diferença na verdade, está na ocorrência ou não de ilícito penal, como cita Álvaro Lazzarini, “com efeito, quando atua na área do ilícito puramente administrativo (preventivamente ou repressivamente), a polícia é administrativa. Quando o ilícito penal é praticado, é a polícia judiciária que age”[3]. Importante salientar que a polícia judiciária tem como especialização as polícias civil e militar, a polícia administrativa está dividida entre todos os órgãos da administração, inclusive a própria polícias civil e a militar, quando atuam como administração.


[1] CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de direito administrativo, vol V, poder de polícia e política, 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.23.
[2] Direito administrativo, p. 109.
[3] Idem, p. 109.

sexta-feira, dezembro 02, 2011

Direito Administrativo Brasileiro - Breves conceitos

limitações administrativas

Um dos objetivos da existência do Estado é a proteção ao bem comum, a paz social, ao bem-estar coleltivo, por isso vários instrumentos são colocados à sua disposição para atingir essas finalidades públicas. Dessa forma, o instrumento da limitação administrativa é impedir (limitar) administrativamente qualquer ato do particular, seja com relação à sua propriedade ou no uso de sua liberdade, no atendimento ao interesse público. Esclareça-se, inicialmente, que liberdade e propriedade não podem ser confundidas com o direito de liberdade e direito de propriedade. O direito de liberdade e o direito de propriedade não podem ser limitados, mas à propriedade e à liberdade o Estado impõe limites quando o uso de ambos fere o direito de outrem. Por isso o Estado, no interesse coletivo e em sua proteção, impede que o uso, ocupação e modificação da propriedade, não atenda o interesse público. Essas limitações podem implicar numa imposição de fazer, não fazer ou abster-se de realizar algo. Quando couber a Administração limitar o uso da liberdade ou da propriedade, o campo é discricionário, no entanto, pelos princípios que regem os atos discricionários, principalmente o da razoabilidade e proporcionalidade, o Poder Público não pode transgredir a liberdade contida na norma. Com relação à limitação imposta pelo poder de polícia (v), esclareça-se que a ordem dada para que o cidadão não pratique determinados atos que possam prejudicar o interesse geral, há clara imposição restringindo ao exercício de liberdades, de direitos e de faculdades; ou que evite fazer alguma coisa que possa causar prejuízos ao poder público condicionando o uso da propriedade e impondo limitação ao exercício de liberdades, de direitos e de faculdades. Esse é o uso da limitação administrativa do poder de polícia. Não discrepa ainda do poder de polícia quando as limitações impostas administrativamente pelo uso das propriedades, portanto, se faz necessária a exposição de conceitos doutrinários. As limitações administrativas são, em primeiro plano, determinações administrativas que decorrem de normas abstratas e gerais as quais impõe a proprietários indeterminados obrigações de utilizarem suas propriedades no sentido de atender a sua função social, no interesse público. Dessa forma, as limitações administrativas são preceitos de ordem pública as quais impõe restrições em caráter geral, sem ônus, unilateral por emanar de autoridade competente, condicionando direitos ou atividades dos particulares adaptando-os ao bem-estar social e em proteção ao interesse coletivo. As restrições possuem as características da generalidade, por ser aplicadas aos proprietários que estão em situação semelhantes; é unilateral pela norma imposta independer do cidadão atingido; são restrições imperativas por decorrer do jus imperii; não são confiscatórias, pois não acarreta a perda da propriedade. Já consolidado por nossos Tribunais Superiores a indenização que deve ser feita na perda da propriedade. Essas limitações decorrem do poder que o Estado exerce sobre todas as coisas sob seu território, sem extinguir os direitos dos particulares, mas devendo adequar tais direitos aos interesses coletivos. A Lei 4.771/65, que instituiu o Código Florestal, em seu art. 18, dispõe que o Poder Público poderá florestar ou reflorestar terras privadas onde for necessário, caso o proprietário não faça. O § 1º estabelece indenização ao proprietário caso as áreas atingidas estiver sendo utilizadas com culturas e, ainda, a área atingida por essa limitação será isenta de tributação. A limitação ou intervenção na propriedade privada, no caso do Código Florestal, ocorre sem desapropriação. No entanto, se o proprietário estiver praticando conduta ilícita não haverá indenização[1]. As limitações administrativas devem ser obedecidas quando as construções afetam os direitos de vizinhança. O art. 1.299 do CC estabelece que o “proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos”. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovado em 26 de agosto de 1789, pela Assembleia Constituinte, no contexto inicial da Revolução Francesa, reconheceu em seu inciso XVII, que o direito de propriedade era inviolável e sagrado e que “ninguém dela pode ser privado se não for por necessidade pública, legalmente constatada, sob a condição de uma justa e prévia indenização”. As limitações administrativas são limitadas à necessidade de intervenção da propriedade privada pelo Estado no sentido de coibir ações prejudiciais à sociedade, no entanto, quando o Poder Público impede o uso da propriedade pela limitação imposta transforma-se em desapropriação indireta (v), ação do Poder Público que não encontra respaldo em nossa legislação[2]. A Lei 10.257/2001, que dispõe sobre o Estatuto da Cidade, obriga, em seu art. 5º, o proprietário a utilizar da propriedade de modo compatível com as exigências do Poder Público, sob pena do parcelamento ou edificação ocorrer de forma compulsória. Ainda, no mesmo estatuto há previsão legal ao direito de preferência para o Município adquirir o imóvel urbano que não atende aos interesses sociais, artigos 25 e 26. Já o art. 36 ocorre a limitação que se refere ao estudo de impacto de vizinhança[3]. São formas de limitações administrativas inseridas no Estatuto da Cidade em nítida intervenção do Poder Público na propriedade privada.





[1] Recurso Especial nº 1.237.071 - PR (2011/0030781-4) Relator: Ministro Humberto Martins
[2] Recurso Especial nº 416.511/SP (2002/0016067-8) Relatora: Ministra Eliana Calmon: “A limitação administrativa que impede o uso, gozo e disposição da totalidade de uma determinada área desnatura-se em uma verdadeira desapropriação indireta – Precedentes”.
[3] Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal.

segunda-feira, novembro 28, 2011

Processo Administrativo

Administrativo - Servidor público federal - Dano ao erário - Cobrança na via administrativa por emissão de GRU - Necessidade de processo judicial - Precedentes

RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR CONDUTA DOLOSA OU CULPOSA CAUSADORA DE DANO AO ERÁRIO. COBRANÇA NA VIA ADMINISTRATIVA POR MEIO DA EMISSÃO DE GRU. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO EXPRESSA E FORMAL. NECESSIDADE DE PROCESSO JUDICIAL. PRECEDENTES.

1. Em se tratando de responsabilidade civil de servidor público por conduta dolosa ou culposa causadora de dano ao erário, somente se houver sua autorização formal será possível a realização de descontos em seus vencimentos de valores devidos a título de ressarcimento, nos termos do art. 46 da Lei nº 8.112?90, ou de sua cobrança por meio da emissão de GRU, como no caso. Se não houver, contudo, sua expressa anuência, é necessário o ajuizamento de ação judicial pela Administração com a finalidade de, apurada sua responsabilidade civil subjetiva, condená-lo a ressarcir o prejuízo causado ao erário.

2. "O Estatuto do Servidores Públicos prevê a responsabilização civil do servidor público, quando este causar prejuízo ao erário ou a terceiros, porém, a via adequada para apuração do dano causado e conseqüente aplicação da pena de restituição do prejuízo deve ser o processo judicial regular." (REsp 669953?RJ, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJ 06?12?2004).

3. Recurso especial improvido.

(STJ - REsp 1163855/RJ - Rel. Min. Maria Thereza Rocha de Assis Moura - DJe de 19.9.11)

quinta-feira, novembro 24, 2011

Direito Administrativo Brasileiro - Breves conceitos


Poder DISCricionário

A conduta do administrador público deve estar traçada por uma legislação rígida e, ao mesmo tempo, de fácil interpretação por parte do cidadão. O administrador deve obedecer as leis, princípios e as normatizações administrativa (princípio da legalidade) fazendo com que suas condutas estejam a ela vinculadas, ficando impedido de se desviar dos preceitos da norma. Por outro lado muitas vezes encontra-se impedido de atender as necessidades públicas e efetivar o serviço público por não ter liberdade de ação, ou mesmo, por falta de previsão legal o administrador público não conduz os serviços públicos como deveria. Assim, poder discricionário pode ser definido como sendo a faculdade conferida à autoridade administrativa para que, de forma legal, exerça o poder de decisão escolhendo as várias soluções possíveis. Ou em lição de Hely Lopes Meirelles, “poder discricionário é o que o Direito concede à Administração, de modo explícito ou implícito, para a prática de atos administrativos com liberdade na escolha de sua conveniência, oportunidade e conteúdo[1], ainda que restrito dentro da lei. A liberdade que se fala é a liberdade no interior da lei, não é concebível ato sem a devida atenção ao princípio da legalidade. Por isso a liberdade que se entende é a escolhida pelo administrador e não pelo Juiz, pois caberá àquele a administração da coisa pública. Daí se vê que a contraposição da discricionariedade é a vinculação. A discricionariedade caracteriza-se por um poder de escolha para solução que poderia ser encontrada outras situações também válidas pelo ordenamento jurídico. A prática do ato discricionário exige competência legal de quem o pratica; adotar uma formalidade exigida pela norma para realizar o ato e, importante, é a finalidade pública que se encontra em todos os atos administrativo, ou seja, o interesse público. Essa margem de liberdade permitida traduz-se no mérito administrativo[2], que é expresso no juízo de conveniência e oportunidade de escolha para a prática do ato em atenção ao interesse público. A conveniência para a prática do ato é a condição que se vai conduzir o agente e a oportunidade é o momento em que a atividade a ser desenvolvida será produzida. Há uma moderna tendência de controle do ato discricionário para adequação da conduta do agente público. Porém a vedação do controle judiciário com relação à discricionariedade é o controle da conveniência e oportunidade do ato, mas sendo obrigatório controlar a legalidade do ato. O controle do ato administrativo deve ocorrer quando analisado os motivos, a finalidade e a causa do ato. Os motivos pela razão óbvia da existência das inúmeras nulidades do ato causadas por motivos que violem a legalidade ou a ordem jurídica. Examinar a finalidade do ato é controlar a legitimidade de atuação da administração e, sobretudo, impedir o desvio de poder (v). O exame da causa do ato significa dizer que o controle deve se ater entre a adequação dos pressupostos do ato e o seu objeto. Como na lição de Celso Antônio Bandeira de MELLO quando diz que o “exame da causa apresenta especial relevo nos casos em que a lei omitiu-se na enunciação dos motivos, dos pressupostos, que ensejaram a prática do ato” [3]. Uma das justificativas para a existência do poder discricionário é a enorme gama de serviços que o Estado deve desempenhar, a complexidade das funções e várias outras mudanças modernas que é necessária maior flexibilidade para que o administrador possa atuar em busca da finalidade pública. Uma das secretarias que mais aparece a discricionariedade para a administração pública parece ser no planejamento, pois necessário poder de decisão e iniciativa para adoção de medidas de desenvolvimento e assistência ao Estado. Várias outras poderiam ser citadas, na gestão interna do órgão ou entidade, na solução de situações de emergência etc. A discricionariedade não pode ser confundida arbitrariedade. Aquela é a liberdade de escolher os critérios para atuar legalmente em favor da administração e da cidadania e esta, a arbitrariedade é o atuar, sob o pretexto de agir discricionariamente, fora dos limites da lei ou em ofensa direta aos princípios e leis. Salienta-se por fim, a questão discricionária quando da restrição do seu espaço no mundo jurídico, na perspectiva da teoria dos conceitos jurídicos indeterminados, desenvolvida na Alemanha e, segundo Edimur Ferreira de FARIA, seriam os “vários comportamentos da Administração, tido até então como discricionários, eram, na verdade, casos de intelecção da lei e não de escolha. Assim, no caso concreto, a autoridade não terá a faculdade de valorar, mas o dever de descobrir na lei a sua vontade para aquela situação fática. Só há poucos anos iniciou-se o estudo e a adoção da teoria dos conceitos jurídicos indeterminado no Direito brasileiro. São exemplos de conceitos jurídicos indeterminados ou vagos[4]: notório saber, boa reputação, pobreza, interesse público, imediatamente etc”[5].


[1] Direito administrativo brasileiro, p. 121
[2] Celso Antônio Bandeira de MELLO leciona que “mérito do ato é o campo de liberdade suposto na lei e que efetivamente venha remanescer no caso concreto, para que o administrador, segundo critérios de conveniência e oportunidade, decida-se entre duas ou mais soluções admissíveis perante a situação vertente, tendo em vista o exato atendimento da finalidade legal, ante a impossibilidade de ser objetivamente identificada qual delas seria a única adequada”, p. 932/933
[3] Curso, p. 951.
[4] Celso Antônio Bandeira de MELLO, escreve que: “deveras, a apreensão do significado dos conceitos imprecisos é, sem dúvida, um ato de intelecção e ao Judiciário assiste praticá-lo para interpretar a lei. As decisões de mérito são, induvidosamente, atos volitivos, decididos segundo critérios de conveniência e oportunidade, que traduzem opção por um entre dois ou mais comportamentos pela norma a ser aplicada. Daí não se segue entretanto que só nesta segunda hipótese esteja a Administração a exercer atividade discricionária (apud Edimur Ferreira de FARIA, p. 292)
[5] Curso de direito administrativo positivo 7 ed., p. 292.

Direito Administrativo Brasileiro - Breves conceitos

PODER REGULAMENTAR

A Administração Pública precisa de mecanismos para complementação das leis no sentido de sua efetiva aplicabilidade, ou seja, a edição de leis pelo Poder Legislativo pode deixar que tais leis não venham a ser exequíveis sem que haja um regulamento para fielmente cumprir a execução. O art. 84, inc. IV da CF, estabelece privatividade ao Presidente da República e, pelo princípio da simetria, aos Governadores e Prefeitos, poder “sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução”. Dessa forma, o poder regulamentar, definido como uma atribuição ao Chefe do Poder Executivo para, mediante decreto, expedir atos normativos, chamados regulamentos, compatíveis com a lei e visando desenvolvê-la[1], destina-se a deixar claro o teor das leis e, como deixa entrever o inc. IV, prepará-las para execução, podendo até a completar as leis, se for o caso. É um dos exercícios do poder normativo (v) no âmbito do Poder Executivo. Tratado como poder secundário, pois regulamenta uma lei preexistente, contrário às leis que são originárias, ou seja, tem seu nascedouro de forma primária. A formalização do poder regulamentar ocorre por decretos e regulamentos, como transcrito acima no art. 84, inc. IV da CF/88. Alguns outros atos normativos podem ser considerados como inseridos no Poder Regulamentar do Executivo, por exemplo, as portarias, resoluções etc. Há impedimento que o Executivo torna-se legislador fora dos dispostos na CF/88, mas na modernidade, com a crescente responsabilidade da Administração e das inúmeras atividades, passou-se a aceitar “o fenômeno da deslegalizacao, pelo qual a competência para regular certas matérias se transfere da lei (ou ato análogo) para outras fontes normativas por autorização do próprio legislador: a normatização sai do domínio da lei (domaine de la loi) para o domínio do ato regulamentar (domaine de l’ordonnance)”[2]. A explicação é de fácil entendimento, pois o Legislativo delega o poder de institui a regulamentação por ser complexa tecnicamente, em vista de o Executivo dispor de vários técnicos e especialistas para o devido acompanhamento do processo legislativo. Importante ressaltar que não se delega o poder de criação das leis, mas sim competência para um regramento básico, pois o que se pretende é a existência de um discricionarismo técnico na elaboração do regulamento. Exemplo são os regulamentos emanados das agencias reguladoras, onde se consolidou o poder de criação de normas técnicas buscando a organização de seus objetivos. O exercício do poder regulamentar somente pode ocorrer segundo a lei, ou seja, se for contrário à lei será inválido, e, relevante é saber que os atos regulamentares não criam direitos ou deveres, apenas e tão simplesmente regulamentam o exercício de uma lei. O regulamento fixa apenas obrigações subsidiárias e não as primárias ou originais, pois aquelas são as que efetivam o regulamento e estas são as que impõem condutas aos administrados. O Executivo, no desempenho de sua missão administrativa, necessita, às vezes de complementar o mandamento legal imposto pelo Legislativo e o faz por meio dos atos de regulamentação. No caso, se for oferecido um prazo para a regulamentação e esse prazo não for cumprido, a lei deve tornar exequível. Tal obrigação imposta se dá em razão de não deixar que a vontade do legislador fique no ar, sem uma tomada de decisão para a efetiva execução legal. Acaso ocorrer a omissão do Chefe do Poder Executivo, o administrado titular de direito e que se encontra prejudicado pela omissão poderá impetrar ação no judiciário para exercer tais direitos, como, por exemplo, mandado de injunção (v). Na omissão do prazo para regulamentação que deve ser fixado na lei, julga-se inconstitucional. O art. 49, V, da CF/88 estabelece que caberá ao Congresso Nacional de forma exclusiva “sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa”, ou seja, evita-se com o controle dos atos de regulamentação, que ocorra conflitos com a lei que deve regulamentar. Pode ser também que o regulamento seja inconstitucional permitindo a impugnação dos efeitos do ato. Por fim, importante é a posição doutrinária de Maria Sylvia Z. DI PIETRO sobre o assunto, pois afirma que o poder regulamentar é o poder normativo (v) do estado, em vista desse poder não esgotar a competência normativa do Estado; “é apenas uma de suas formas de expressão, coexistindo com outras..”[3].


[1] GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, p. 172.
[2] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, p. 48.
[3] Direito administrativo, p. 82.

domingo, novembro 20, 2011

Direito Administrativo Brasileiro - Breves conceitos

Poder de polícia

Críticas são feitas a respeito da expressão “poder de polícia”, pois trata-se de expressão que parece consolidar o “Estado de Polícia”, antecessor do Estado de Direito. Mas expressões à parte, necessário estudar o Poder de Polícia, neste caso, sob o ângulo do Direito Tributário e a repercussão que tem sob a vida social. A expressão tem gerado discussões no âmbito acadêmico, no entanto é muito utilizada na Europa, segundo informa Celso Antônio Bandeira de Mello: “limitações administrativas à liberdade e à propriedade”. Ainda, ao utilizar-se a expressão poder de polícia haveria de lembrar época pretérita do Estado de Polícia, que precedeu o Estado de Direito. Sem ofensas, claro, tal discussão é inócua em vista de ter consolidada a expressão “poder de polícia” sem querer se referir ao Estado de Polícia ou lembrar épocas de restrições à liberdade e propriedade. A utilização da expressão Poder de Polícia deve permanecer e ser utilizada para orientação da efetiva manifestação do poder público em defesa da tranquilidade pública. O Estado não pode abrir mão de impedir ou limitar o uso, gozo e disposição da propriedade e da liberdade. O uso e gozo da propriedade e liberdade do indivíduo não é ilimitada, ao contrário, é condicionada ao respeito que se deve com o bem-estar social ou com o próprio interesse do Poder Público. O particular não pode, com seus atos ou com o uso da propriedade, ferir os interesses públicos e sociais. Por isso o Estado, em proteção à coletividade, limita administrativamente a liberdade e a propriedade do sujeito, compreendendo, assim, o Poder de Polícia Administrativa. Otto Mayer, citado por Diogo de Figueiredo Moreira Neto, propõe um conceito simples e preciso: poder de polícia é “a atividade do Estado que visa a defender, pelos meios do poder da autoridade, a boa ordem da coisa pública contra as perturbações que as realidades individuais possam trazer”[1]. Marcelo Caetano, citado pelo mesmo autor acima, expõe que: é “o modo de atuar da autoridade administrativa, que consiste em intervir no exercício das atividades individuais suscetíveis de fazer perigar interesses gerais, tendo por objeto evitar que se produzam, ampliem ou generalizem os danos sociais que as leis procuram prevenir”[2]. Os conceitos convergem para o entendimento claro da utilização do poder de polícia em prol da coletividade, por isso Hely Lopes Meirelles estabelece que “poder de polícia é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”[3] e José Cretella Júnior define como “a faculdade discricionária da Administração de, dentro da lei, limitar a liberdade individual em prol do interesse público”[4]. Os conceitos transcritos são dirigidos à polícia administrativa, ou seja, à polícia difundida por toda a Administração Pública que cuida, genericamente, da segurança, da salubridade, da moralidade pública e do convívio social e, especificamente, da polícia que regulamenta as atividades humanas que possam a afetar aos interesses coletivos. Como exemplo desta atividade administrativa específica temos a polícia das construções, das atividades empresariais/comerciais regulamentando horários e dias de aberturas, das indústrias cujas atividades sejam nutricionais, dentre outras atividades que exijam a fiscalização do Estado. O artigo 78 do Código Tributário Nacional define o poder de polícia como “a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”. Algumas características importantes são marcadas, mesmo com algumas divergências a respeito das características do poder de polícia, principalmente na delimitação do próprio tema. Alguns autores dizem serem características e outros atributos poder de polícia. Ao discorrer sobre o tema necessariamente devemos mencionar as questões da 1) discricionariedade, que é o atributo no qual a atuação da Administração Pública tem a livre escolha para exercer o seu papel na aplicação de sanções e na proteção ao interesse público. Essa livre escolha, dentro do poder discricionário da Administração, fica restrita a lei criadora do ato de polícia, a oportunidade e conveniência no seu exercício; 2) auto-executoriedade: na Administração Pública alguns comandos devem ser automáticos, pois o administrador público, na preservação do jus imperii, e para poder executar determinados atos em prol da coletividade, na nítida e clara percepção do bem estar social, precisa ter a força de comandar certos atos de polícia. Assim, o direito pátrio atribuiu ao administrador a faculdade de decisão e execução de seus próprios atos sem necessitar do Poder Judiciário; 3) coercibilidade que é o atributo ao qual a Administração Pública impõe as medidas legais adotadas e tem indissociável harmonia com a auto-executoriedade, pois o ato de polícia só pode ser executável se os dois atributos existirem no momento de sua aplicação. Os dois atributos são tão ligados que não se distinguem. Todo ato de polícia administrativa é coativo e, se necessário, a Administração poderá usar de força para o cumprimento da determinação exarada. A ação da Administração que determina e executa o ato, ou mesmo aplica a sanção, deve ser justificada, pois não coaduna com a Administração Pública o exercício da força desproporcional e desnecessária. O poder do Estado não é ilimitado e nem poderia ser em vista do interesse público que o envolve. Em consequência o poder de polícia também não é ilimitado, pois o Estado necessita de freios para que sua atuação seja legitimada pela lei que cria o ato, pois caso contrário incidirá em ato arbitrário, por abuso ou desvio de poder. As limitações administrativas são consideradas meios interventivos e pode-se conceituar como uma imposição geral do Estado condicionando os direitos na propriedade privada e nos limites dos direitos do cidadão. O Estado, dentro de sua soberania interna, condicionará a utilização da propriedade e das atividades dos particulares que deverão estar voltadas para o bem comum. A propriedade tendo sua função social e as atividades dos particulares sendo exercidas respeitando os limites dos direitos dos outros. Assim, “limitação administrativa é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar social”[5]. O Poder de Polícia se concretiza por meio de leis e regulamentos, pois é por estes meios que se disciplinam abstratamente determinadas. A CF/88 em seu artigo 145, III, estabelece que a União, os Estados, o Distrito Federal e Municípios poderão instituir taxas em razão do exercício do poder de polícia, positivando em sua lei maior a possibilidade da exação de uma taxa quando houver efetivo exercício da administração.


[1] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
[2] idem
[3] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 36 ed., pg. 134.
[4] CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de direito administrativo, v. 5: poder de polícia e política. 2 ed.Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 17
[5] MEIRELLES, Hely Lopes, op.cit.p. 664

Direito Administrativo Brasileiro - Breves conceitos

PLANO DIRETOR
  
O art. 182 da CF/88 estabeleceu a obrigação de todos os municípios criarem uma política de desenvolvimento urbano com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e, com esse plano criado e desenvolvido, garantir aos cidadãos o bem-estar. O desenvolvimento deve ser pleno para também pleno o uso do espaço público e privado aos habitantes urbanos. O § 1º deste artigo, ao orientar o Administrador Público para os objetivos legais, determina a obrigatoriedade também de um plano diretor, assim dispondo: “o plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana”. Cidades em pleno desenvolvimento devem propor uma lei que estabeleça o plano de desenvolvimento urbano, como expansão e planejamento para aproveitamento adequado do solo urbano. Necessário prevenir um crescimento desordenado, como muitas cidades brasileiras que, por falta de um plano diretor cresceu desordenadamente e transformou-se em um verdadeiro caos. O plano diretor é um dos principais instrumentos de participação e solidariedade no espaço urbano, criando condições de uma convivência social harmoniosa e salutar. Tem o conceito voltado justamente para o desenvolvimento e a organização das cidades. Hely Lopes MEIRELLES conceitua plano diretor como sendo “o complexo de normas legais e diretrizes técnicas para o desenvolvimento global e constante do Município, sob os aspectos físico, social, econômico e administrativo, desejado pela comunidade local”[1] A Lei 10.257/01, que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana trata do plano diretor em seus arts. 39 a 42. O art. 40 da Lei diz que o plano diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana e deve fazer parte integrante do processo de planejamento municipal (§ 1º). Os municípios, para implantação do plano diretor, devem aprovar uma lei complementar, segundo dispõe o item XII, do art. 29 da CF/88. É instrumento legal que deve possuir um dinamismo como as mudanças impostas pelas cidades, passando por frequentes revisões e ajustes sociais para enfrentamento da realidade. Deve ficar claro que o plano diretor não é um orientador para a Administração Pública no sentido de construir e empreender serviços e obras, mas sim um empreendimento social de implantação das soluções para atendimento das necessidades públicas. Para a elaboração do plano diretor necessário coleta de dados, interpretação dos dados e fixação dos objetivos a serem alcançados pela Administração Municipal.  


[1] Direito municipal brasileiro. 14 ed. São Paulo: Malheiros, p. 538

O passado não é aquilo que passa, é aquilo que fica do que passou.   Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde)