domingo, novembro 20, 2011

Direito Administrativo Brasileiro - Breves conceitos

PLANO DIRETOR
  
O art. 182 da CF/88 estabeleceu a obrigação de todos os municípios criarem uma política de desenvolvimento urbano com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e, com esse plano criado e desenvolvido, garantir aos cidadãos o bem-estar. O desenvolvimento deve ser pleno para também pleno o uso do espaço público e privado aos habitantes urbanos. O § 1º deste artigo, ao orientar o Administrador Público para os objetivos legais, determina a obrigatoriedade também de um plano diretor, assim dispondo: “o plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana”. Cidades em pleno desenvolvimento devem propor uma lei que estabeleça o plano de desenvolvimento urbano, como expansão e planejamento para aproveitamento adequado do solo urbano. Necessário prevenir um crescimento desordenado, como muitas cidades brasileiras que, por falta de um plano diretor cresceu desordenadamente e transformou-se em um verdadeiro caos. O plano diretor é um dos principais instrumentos de participação e solidariedade no espaço urbano, criando condições de uma convivência social harmoniosa e salutar. Tem o conceito voltado justamente para o desenvolvimento e a organização das cidades. Hely Lopes MEIRELLES conceitua plano diretor como sendo “o complexo de normas legais e diretrizes técnicas para o desenvolvimento global e constante do Município, sob os aspectos físico, social, econômico e administrativo, desejado pela comunidade local”[1] A Lei 10.257/01, que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana trata do plano diretor em seus arts. 39 a 42. O art. 40 da Lei diz que o plano diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana e deve fazer parte integrante do processo de planejamento municipal (§ 1º). Os municípios, para implantação do plano diretor, devem aprovar uma lei complementar, segundo dispõe o item XII, do art. 29 da CF/88. É instrumento legal que deve possuir um dinamismo como as mudanças impostas pelas cidades, passando por frequentes revisões e ajustes sociais para enfrentamento da realidade. Deve ficar claro que o plano diretor não é um orientador para a Administração Pública no sentido de construir e empreender serviços e obras, mas sim um empreendimento social de implantação das soluções para atendimento das necessidades públicas. Para a elaboração do plano diretor necessário coleta de dados, interpretação dos dados e fixação dos objetivos a serem alcançados pela Administração Municipal.  


[1] Direito municipal brasileiro. 14 ed. São Paulo: Malheiros, p. 538

Breves Conceitos de Direito Administrativo Brasileiro

PERMISSÃO

A definição está condicionada a dois objetos: o primeiro é a permissão para prestação de serviços públicos e o segundo a utilização privativa de determinado bem público. Assim, alguns conceitos doutrinários esclarecem a figura da permissão em nosso direito. Um primeiro conceito que se transcreve é: “ato administrativo, vinculado ou discricionário, segundo o qual a Administração Pública outorga a alguém, que para isso se interesse, o direito de prestar um serviço público ou de usar, em caráter privativo, um bem público”[1]. Hely Lopes MEIRELLES conceitua como sendo um “ato administrativo negocial, discricionário e precário, pelo qual o Poder Público faculta ao particular a execução de serviços de interesse coletivo, ou o uso especial de bens públicos, a título gratuito ou remunerado, nas condições estabelecidas pela Administração”[2]. As divergências apontadas sobre a permissão é o entendimento na qual é modalidade de ato administrativo unilateral, discricionário e precário da Administração, pois atualmente a Lei 8.987/95, em seu art. 2º, inc. IV dispõe que permissão de serviço público é a delegação, a título precário, mediante licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco. O art. 4º da mesma lei estabelece que “a concessão de serviço público, precedida ou não da execução de obra pública, será formalizada mediante contrato, que deverá observar os termos desta Lei, das normas pertinentes e do edital de licitação”. Dessa forma, teríamos que aplicar conceitos diversos para permissão. A permissão para o particular explorar bem público é discricionária, por exemplo, utilização de um espaço público para pequeno comércio de jornais e revistas; unilateral e precária já, para a exploração de serviço público é vinculada, bilateral e duradoura, por exemplo, após o processo licitatório a prestação de serviço público. Neste caso de prestação de serviço público a CF/88, em seu art. 175, disciplina que “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”, obrigando que a lei que autorizar a permissão ou concessão do serviço deve adotar ”o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; os direitos dos usuários; política tarifária; a obrigação de manter serviço adequado”. Também no caso da permissão para exploração de serviço público, o art. 40 da Lei 8.987/95, dispõe que “será formalizada mediante contrato de adesão, que observará os termos desta Lei, das demais normas pertinentes e do edital de licitação, inclusive quanto à precariedade e à revogabilidade unilateral do contrato pelo poder concedente”. O Poder Público deve, em determinados casos, criar a permissão condicionada, também denominada de permissão contratual, ou seja, aquela que autolimita os prazos, as razões da revogação, garantias aos permissionários. No dizer de Hely Lopes MEIRELLES, “reduzem-se a discricionariedade e a precariedade da permissão às condições legais de sua outorga. Essa modalidade é adotada nas permissões de transporte coletivos e noutras que exigem altos investimentos para a execução do serviço, tornando-se necessário garantir ao permissionário um tempo mínimo de operação em condições rentáveis”[3]. Já a permissão de uso de bem público atende aos interesses da pessoa pública e do particular que recebe o bem das mãos da Administração Pública por meio de um ato administrativo “negocial, unilateral, discricionário e precário”. O termo a ser adotado para a formalização da permissão, como ato negocial, pode adotar condições ou não, gratuito ou remunerado, por tempo certo ou indeterminado. Independente das condições impostas, a permissão sempre será modificável e revogável unilateralmente pela Administração. No caso de revogação do ato não há indenização ao permissionário, com exceção quando o contrato é por tempo determinado e essa revogação ocorre antes do prazo acordado. Fica clara a proteção legal ao permissionário quando do uso especial e individual do bem público. O STJ tem decidido que “a revogação do direito de ocupação de imóvel público, quando legítima, de regra, não dá margem a indenização”[4]. A Lei 9.636/98 dispõe em seu art. 22, a permissão de uso de áreas de domínio da União para a realização de eventos de curta duração, de natureza recreativa, esportiva, cultural, religiosa ou educacional, poderá ser autorizada, na forma do regulamento, sob o regime de permissão de uso, em ato do Secretário do Patrimônio da União, publicado no Diário Oficial da União”. A Lei 8.666/93, em seu art. 2º, obriga a todos a proceder licitação, quando houver intenção de permitir a utilização de bem público. Por fim, a permissão de uso não pode ser confundida com a autorização de uso, pois nesta o que prevalece é o interesse privado. Naquela, os interesses são harmonizados, pois a Administração Pública possui interesse na exploração do bem público pelo particular que, por sua vez, busca o lucro na utilização do bem.


[1] GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2010 p. 135
[2] Direito administrativo brasileiro, p. 192
[3] Op. cit. p, 193
[4] Recurso Especial n. 904.676/DF. Relator:: MINISTRO LUIZ FUX Data do Julgamento 18/11/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 15/12/2008

sábado, novembro 19, 2011

Breves Conceitos de Direito Administrativo Brasileiro

PENALIDADE ADMINISTRATIVA


O meio de assegurar a eficácia da lei e restaurar a ordem é aplicar sanção àquele que violou uma norma. As sanções administrativas têm, fundamentalmente, o caráter de manter e corrigir as condutas na administração pública. Contrário ao que prescrevem as penalidades criminais que atribuem à penalidade um caráter retributivo, uma reação da sociedade ao que causou um ato reprovável e uma correção que visa impedir novos delitos e reajuste de conduta. A aplicação da pena administrativa deve ser acompanhada de motivação observando-se as circunstâncias do evento, a gravidade da infração, os danos e, principalmente, o comportamento anterior do servidor. No ilícito administrativo não há a mesma tipicidade do ilícito penal. Não há uma definição precisa dos ilícitos administrativos e essa imprecisão limita a lei a expressar-se para dizer que houve descumprimento dos deveres, que os procedimentos irregulares etc. Pela discricionariedade na aplicação da penalidade administrativa não há previsão legal de agravamento ou abrandamento, mas sim observação da autoridade administrativa aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade e também ao que dispõe o art. 128 da Lei 8.112/90 que assim tem seu texto: “na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais”. Também deve a autoridade administrativa, ao apenar, mencionar (motivação) sempre o fundamento legal e a causa da sanção disciplinar (parágrafo único do art. 128). As penalidades disciplinares, segundo o art. 127 da Lei 8.112/90, são: 1) advertência será aplicada por escrito em faltas de menor gravidade desde que não justifique imposição mais grave, art. 129[1]; 2) suspensão, é o afastamento compulsório temporário do funcionário que cometer reincidência nas faltas que já sofreu punição e em outras faltas que não tipifiquem infração sujeita a penalidade de demissão. Os dias de suspensão serão descontados do servidor e esses dias não poderão superar 90 dias, segundo o disposto no art. 130[2]. A penalidade poderá ser convertida em multa, na base de 50% (cinquenta por cento) por dia de vencimento ou remuneração. Nesse caso o servidor fica obrigado a permanecer em serviço (§ 2º do art. 130); 3) demissão é uma sanção disciplinar aplicada no caso de falta grave cometida pelo servidor público no exercício de suas funções. Sanção aplicável de modo definitivo ao servidor por cometimento de falta de extrema gravidade, tornando incompatível a permanência do servidor nos quadros administrativos. Para aplicação da pena de demissão é necessária a formalização de processo ou inquérito administrativo com amplo direito de defesa e ampla defesa. A aplicação da pena de demissão deve estar bem clara nas normas administrativas, não podendo ocorrer dúvidas quanto ao processo ou inquérito, bem como a atenção aos requisitos formais. A demissão será aplicada nos seguintes casos: 1) crime contra a administração pública, nesse caso será todo e qualquer crime cometido contra a administração pública, não somente os capitulados no Código Penal. O art. 92, I, do Código Penal que são efeitos da condenação a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos. Os crimes previstos na Lei 8.666/93 também acarretam a demissão, também nos casos de crimes de responsabilidades. Pode ocorrer, em alguns casos, de a demissão acarretar a inabilitação do servidor por cinco anos para cargo público federal, e também em casos que a inabilitação será definitiva;  2) abandono de cargo, ausência no serviço público que efetivamente configura abandono, ou seja, o servidor, por 30 dias consecutivos abandona o serviço; 3) inassiduidade habitual, é a falta ao serviço público, por 60 dias sem justificar, em um período de 12 meses; 4) improbidade administrativa, comportamento reprovado pela Constituição Federal e vários institutos legais. Na CF/88, artigo 37, § 4º, estabeleceu dimensão especial aos casos de improbidade administrativa; 5) incontinência pública e conduta escandalosa, na repartição, é comportamento que compromete os serviços públicos, a moral e ética comum, a credibilidade da repartição e deve ser incompatível com os serviços públicos; 6) insubordinação grave em serviço, desobedecer ordens superiores com graves ofensas ou violentas desprestigiando ostensivamente o superior hierárquico; 7) ofensa física, em serviço, a servidor ou a particular, salvo em legítima defesa própria ou de outrem, é a violência praticada quando em serviço e no exercício de suas funções; não é necessário que a ofensa seja realizada dentro da repartição pública, quando o servidor não está em serviço não poderá ser demitido por esse motivo, como já decidiu o TRF da 5ª Região[3]; 8) aplicação irregular de dinheiros públicos é a aplicação de dotação pública diversa da permitida ou determinada pela legislação orçamentária, processamento de despesa pública etc; 9) revelação de segredo do qual se apropriou em razão do cargo, o dever funcional é guardar segredo quando exige o exercício do cargo, dever punível até quando ocorrer a facilitação, e é tipificado como crime pelo artigo 325 do CP[4];  10) lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio nacional danos patrimoniais causados à Administração que causa incompatibilidade com o exercício de cargo público federal; 11) corrupção, comportamento que pode ser enquadrado em outros comportamentos descritos na Lei 8.112/90; 12) acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas, se o servidor agiu de má-fé deve responder e perder ambas as funções ou cargos, mas no caso de boa-fé o servidor deve optar por um, sem ser apenado; 13) transgressão dos incisos IX a XVI do art. 117, são vedações funcionais que devem ser observadas e, na falta pode causar demissão:IX - valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública; X - participar de gerência ou administração de sociedade privada, personificada ou não personificada, exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário; XI - atuar, como procurador ou intermediário, junto a repartições públicas, salvo quando se tratar de benefícios previdenciários ou assistenciais de parentes até o segundo grau, e de cônjuge ou companheiro;       XII - receber propina, comissão, presente ou vantagem de qualquer espécie, em razão de suas atribuições; XIII - aceitar comissão, emprego ou pensão de estado estrangeiro; XIV - praticar usura sob qualquer de suas formas; XV - proceder de forma desidiosa; XVI - utilizar pessoal ou recursos materiais da repartição em serviços ou atividades particulares. Diferente de exoneração que não é sanção disciplinar, mas sim exclusão dos quadros administrativos de servidor instável, podendo ser por razões de interesse público, dentre outros motivos.


[1] A advertência será aplicada por escrito, nos casos de violação de proibição constante do art. 117, incisos I a VIII e XIX, e de inobservância de dever funcional previsto em lei, regulamentação ou norma interna, que não justifique imposição de penalidade mais grave.
[2] A suspensão será aplicada em caso de reincidência das faltas punidas com advertência e de violação das demais proibições que não tipifiquem infração sujeita a penalidade de demissão, não podendo exceder de 90 (noventa) dias.
[3] Reexame Necessário nº 5823-CE (2008.81.00.008974-1) Remte: Juízo da 3ª Vara Federal do Ceará (Fortaleza) Relatora: Desembargadora Federal Margarida Cantarelli.
[4] Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação: § 1o Nas mesmas penas deste artigo incorre quem: I – permite ou facilita, mediante atribuição, fornecimento e empréstimo de senha ou qualquer outra forma, o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública; II – se utiliza, indevidamente, do acesso restrito. § 2o Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública ou a outrem.

Breves Conceitos de Direito Administrativo Brasileiro

ABUSO DE PODER

O exercício das funções públicas fora da previsão legal, com a clara intenção de perpetrar ilegalidades, o agente público age com excesso de poder ou o denominado desvio de finalidade. A Administração Pública está condicionada a perseguir sempre o resultado do interesse público e bem comum, fim de toda ação do agente. Dessa maneira, o desvio de poder ocorre quando o agente pratica o ato com desvio de sua finalidade legal. Nesse caso, o agente, embora exercendo da competência investida, afasta-se da finalidade pública que todo ato administrativo deve estar norteado, é, na expressão de José CRETELLA JÚNIOR, “o afastamento do espírito da lei, ou seja, para empregar expressão adaptada do direito penal, em “aberratio finis legis”[1]. O ato praticado com abuso de poder é nulo por afrontar a legalidade, já excesso de poder ocorre quando o agente público exorbita de suas funções com desmando ou de forma autoritária, ou seja, atua fora dos limites da competência que lhe é outorgada. Criou-se, assim a teoria do desvio de poder que está circunscrita no conceito do qual “todo ato jurídico, regular na aparência, realizado por agente público com finalidade distinta daquela para a qual devia, está viciado de excesso de poder e é nulo”[2]. Quatro elementos formam tal teoria: 1) a autoridade administrativa usando de sua competência pratica o ato com o desvio de finalidade; 2) competência; 3) utilização do poder discricionário sem buscar a finalidade pública e 4) finalidade diversa conferida pela lei. A declaração de nulidade do ato, por meio de processo administrativo, é uma das formas eficazes de controle da Administração Pública. Os atos administrativos presumem-se válidos, portanto o ônus da prova é de quem alega; no caso as provas podem ser documentais e testemunhais. A Lei 4.717, de 29 de junho de 1965, que regula a ação popular, em seu art. 2º dispõe que “são nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de” desvio de finalidade que o próprio artigo na letra e que assim conceitua: “o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência”. Qualquer indício que venha a revelar a atitude do agente público desviando da finalidade pública para a finalidade privada, movimentos internos que revelem falsidade na motivação do ato ou de modo circunstancial, motivos contraditórios, insuficiente, excesso de motivação são sintomas do desvio de poder. Se o abuso de poder constituir-se ilícito penal, previsto na Lei 4.898/65, o agente que comete a conduta abusiva será penalizado, independente das sanções cíveis e administrativas. O art. 4º, letra a dessa lei dispõe que constitui também abuso de autoridade: ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder. Dessa forma, o ato administrativo praticado com desvio de poder é nulo, tendo o controle final da legalidade ficado ao Poder Judiciário.


[1] Tratado de direito administrativo, vol. II: teoria do ato administrativo, 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 211.
[2] Idem, p. 212.

terça-feira, novembro 15, 2011

Breves Conceitos de Direito Administrativo Brasileiro

DOMÍNIO PÚBLICO


Domínio Público, guardando as devidas divergências doutrinárias, é a somatória dos bens públicos móveis e imóveis. Para Hely Lopes Meirelles, domínio público é “o poder de dominação ou de regulamentação que o Estado exerce sobre os bens do seu patrimônio (bens públicos), ou sobre os bens do patrimônio privado (bens particulares de interesse público), ou sobre coisas inapropriáveis individualmente, mas de fruição geral da coletividade (res nullius)” (H.L.Meirelles, p. 546). Para a maioria da doutrina a noção de domínio público é maior que a noção que se dá para propriedade, pois no conceito de domínio incluem bens que também não pertencem ao Poder Público. Exemplo é que o domínio público abrange os bens do próprio Poder Público e, também, todas as coisas que, “por sua utilidade coletiva, merecem a proteção do Poder Público, tais como as águas, as jazidas, as florestas, a fauna, o espaço aéreo e as que interessam ao patrimônio histórico e artístico nacional” (HLM, 546). Há no domínio público, duas importantes características que demonstram sua exteriorização: a primeira é a soberania que pode ser exercida pelo Poder Público sobre todas as coisas de interesse público, e os direitos de propriedade que incidem sobre os bens pertencentes à entidades públicas, sob a forma de domínio patrimonial (HLM, p. 546). Domínio eminente, segundo Hely Lopes Meirelles, “é o poder político pelo qual o Estado submete à sua vontade todas as coisas de seu território. É uma das manifestações da Soberania interna; não é direito de propriedade” (p. 547). Sobre a diferença existente entre as expressões domínio público e bem público a doutrina aceita que esta é bem mais ampla do que aquela, pois existem bens públicos que são regidos por princípios de direito privado[1]. O capítulo III do CC, a partir do art. 98, dispõe sobre bens públicos. O art. 98 fala que “são públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem” e o art. 99 relaciona quais são os bens públicos e qual a sua classificação: os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças; os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias. Os bens de uso comum do povo e os de uso especial são bens inalienáveis enquanto conservarem a sua qualificação; os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades. Estes bens dominicais podem ser alienados desde que observadas as exigências legais. O parágrafo único estabelece que “não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado”. Os bens públicos possuem características de regime que são: inalienabilidade, impenhorabilidade e imprescritibilidade. Os bens públicos podem ser classificados como sendo: a) de domínio hídrico: águas correntes (mar, rios, riachos etc); águas dormentes (lagos, lagoas, açudes); potenciais de energia hidráulica; b) bens de domínio terrestre: do solo e do subsolo. A aquisição e alienação de bens públicos é a comum como, compra e venda, doação, permuta etc., mais também por formas específicas do Direito Público, como a desapropriação e com o direito de preempção[2]. Alienar bens públicos deve passar por processo legislativo, precedida de avaliação e de licitação, conforme previsto na Lei 8.666/93. A utilização dos bens públicos também depende de vários meios legais e de quais imóveis serão utilizados: a) a utilização dos bens comuns (ruas, praças, estradas, rios etc) são abertos à livre utilização, independente de qualquer manifestação do Poder Público. Já a forma anormal de uso dos bens comuns dependerá sempre de uma legislação que ampare; b) utilização dos bens de uso especial, são aqueles bens que abrigam as repartições públicas e serão utilizados conforme o que se pode deles fazer ou os serviços públicos. Exemplo é a utilização de um museu, depende do serviço prestado no local; c) utilização dos bens dominicais por particulares com exclusividade resultará diferentes atos jurídicos. Podendo ir desde locação, arrendamento, comodato, permissão de uso, concessão de uso, concessão de direito real de uso, concessão de uso especial, autorização de uso e enfiteuse.


[1] Segundo Alexandre Mazza, in Manual de Direito Administrativo, p. 511, “a expressão domínio apresenta extensão menor do que a expressão bem público, pois há bens públicos que ultrapassam a área do domínio público, por serem regidos por princípios de direito comum”.
[2] Direito de preempção está disposto no art. 25 da Lei 10.257/2001, Estatuto da Cidade, onde foi instituída a preferência para o Poder Público na aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares, sempre que o Poder Público necessitar da área para finalidades de interesse urbanísticos, como disposto também no art. 26 do mesmo estatuto.

Breves Conceitos de Direito Administrativo Brasileiro

PARECERES

É ato administrativo de opinião técnica, fundamentado, expedido por órgão ou agente consultivo, destinado a matéria sob sua apreciação e especialização. Os pareceres são apenas consultivos, não tem o condão de vincular a Administração ou mesmo os particulares nas suas motivações ou nas conclusões expostas. Uma ressalva deve ser feita sobre a vinculação das pessoas ao parecer: ele se torna vinculativo na ocorrência de existir, após sua conclusão, uma aprovação, pois a partir deste ato não será o parecer a subsistir, mas sim o ato de aprovação. Se o parecer for meramente opinativo não obriga nem a Administração e nem os administrados, pois é facultativo em vista de ser um juízo de valor do parecerista. A autoridade administrativa que solicitou o parecer não fica obrigada a segui-lo ou atentar-se para suas conclusões, poderá até ser contra aos enunciados do ato. Neste caso o agente que emitiu o parecer não fica responsável com o agente que produziu o ato administrativo final. O contrário ocorre quando o parecer emitido é tido como meio de controle, fundado em preceito legal que prescreve sua solicitação, tornando-se parte do procedimento, pois no caso integra toda formação do ato, consolidando o processo administrativo. Nesse caso o parecer é um dos procedimentos que integra o processo de formação do ato e a sua ausência inquina de nulidade por vício de legalidade. As opiniões podem divergir a respeito dos atos posteriores ao parecer. Se o ato decisório aprova o parecer, este fica vinculado e integrado ao processo que desencadeou a solicitação do parecer. Se o ato decisório não acatar o parecer, o Administrador que expediu o ato deve expor motivadamente sua decisão, sob pena de responder por abuso de poder. As divergências ainda surgem nas modalidades existentes de pareceres. Hely Lopes MEIRELLES diz que no final se subsistir outro ato aprovando o parecer, poderá então revestir-se da modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva[1]. O parecer será normativo quando “aprovado pela autoridade competente, é convertido em norma de procedimento interno, tornando-se impositivo e vinculante para todos os órgãos hierarquizados à autoridade que o aprovou. Tal parecer, para o caso que o propiciou, é ato individual e concreto; para os casos futuros, é ato geral e normativo”[2]. A Professora Maria Sylvia Z. DI PIETRO, em citação de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, expõe que o parecer pode ser facultativo, ou seja, é o que fica a critério da Administração Pública em solicitá-lo ou não e, se adotado como fundamento na decisão final, passa a integrar o ato e também a sua motivação; é obrigatório, quando a lei exige como pressuposto de ato final e vinculante, quando existente a obrigação de solicitá-lo e também de acatá-lo na conclusão final. Não cabe recurso administrativo e não pode ser motivos de processo judicial, para atacar parecer. É o que tem decidido nossos Tribunais: o “parecer emitido pela procuradoria geral do Estado, em processo administrativo disciplinar, não constitui ato coator passível de ação mandamental, ante seu caráter meramente opinativo[3]. Quando o parecer é proferido com erro grosseiro ou má-fé e, por isso causa dano ao erário, o parecerista é responsabilizado, caso contrário não há qualquer responsabilidade. Mesmo quando há obrigação do parecer integrar o processo administrativo, como no art. 38, da Lei 8.666/93, obrigado que o processo administrativo para licitação contenha pareceres técnicos ou jurídicos emitidos sobre a licitação, dispensa ou inexigibilidade (inc. VI). E, ainda, nas decisões do STF, que tem acatado a posição de vinculação do parecerista ao parecer quando o ato final o obrigava à opinião e, salvo quando seu ato foi praticado com culpa ou erro grosseiro, caso contrário não há possibilidades de vinculação. Por isso a adoção da seguinte posição: “Controle externo: É lícito concluir que é abusiva a responsabilização do parecerista à luz de uma alargada relação de causalidade entre seu parecer e o ato administrativo do qual tenha resultado dano ao erário. Salvo demonstração de culpa ou erro grosseiro, submetida às instâncias administrativo-disciplinares ou jurisdicionais próprias, não cabe a responsabilização do advogado público pelo conteúdo de seu parecer de natureza meramente opinativa. Mandado de segurança deferido”[4]. Por fim, necessário expor que a Lei 9.784/99, em seu art. 42 estabelece o prazo de quinze dias para que o órgão consultivo emita um parecer e no § 1º obriga a suspensão do processo com penalidade a quem não apresentar o parecer obrigatório e vinculante no prazo estabelecido no caput do artigo. No § 2º o legislador estabelece, agora, que “se um parecer obrigatório e não vinculante deixar de ser emitido no prazo fixado, o processo poderá ter prosseguimento e ser decidido com sua dispensa, sem prejuízo da responsabilidade de quem se omitiu no atendimento”.



[1] Direito administrativo brasileiro, p. 197
[2] Direito administrativo brasileiro, p. 198
[3] AgRg no Recurso em Mandado de Segurança n. 26.720 Relator: Ministro FELIX FISCHER
[4] MS 24631/DF Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA Julgamento: 09/08/2007 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação DJe-018  PUBLIC 01-02-2008

segunda-feira, novembro 14, 2011

Breves Conceitos de Direito Administrativo Brasileiro

PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA

Nova espécie de concessão de serviço público ou obra pública criada pela Lei 11.079, de 30 de dezembro de 2004. Podemos conceituar a parceria público-privada como sendo um ajuste de caráter público firmado entre a Administração Pública e determinada pessoa de direito privado, “com o objetivo de implantação ou gestão de serviços públicos, com eventual execução de obras ou fornecimento de bens, mediante financiamento do contratado, contraprestação pecuniária do Poder Público e compartilhamento dos riscos e dos ganhos entre os pactuantes”[1]. O art. 2º estabelece que a “parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa”, definindo concessão patrocinada como a “concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado” (§ 1º) e “concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens” (§ 2º). No contrato da parceria incidem as cláusulas exorbitantes, previstas na Lei 8.666/93, ainda a possibilidade de rescisão unilateral e, se ocorrer, as sanções administrativas. A Lei 8.987/95 incide sobre as concessões patrocinadas; nas concessões administrativas podem ser aplicados, subsidiariamente, alguns dispositivos das Leis 8.987/95 e 9.074/95. O objeto do ajuste é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas. As características são: a) possibilidade de financiamento pelo setor privado; b) compartilhamento dos riscos; c) pluralidade compensatória. O art. 4º da Lei 11.079/2004 estabelece quais são as diretrizes a serem observadas: a) eficiência no cumprimento das missões de Estado e no emprego dos recursos da sociedade; b) respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços e dos entes privados incumbidos da sua execução; c) indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado; d) responsabilidade fiscal na celebração e execução das parcerias; e) transparência dos procedimentos e das decisões; f) repartição objetiva de riscos entre as partes; g) sustentabilidade financeira e vantagens socioeconômicas dos projetos de parceria. As cláusulas essenciais, para a contratação das parcerias são as estabelecidas pelo art. 23 da Lei 8.987/95; as essenciais adicionais são as do art. 5º da Lei 11.079; as vedações estão previstas no § 4º do art. 2º: “é vedada a celebração de contrato de parceria público-privada: a) cujo valor do contrato seja inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais); b) cujo período de prestação do serviço seja inferior a 5 (cinco) anos; ou c) que tenha como objeto único o fornecimento de mão de obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública. O § 3º estabelece a obrigação da contraprestação: “não constitui parceria público-privada a concessão comum, assim entendida a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado”. O parágrafo único, do art. 6º da Lei 11.079, vigora o princípio da variabilidade remuneratória, ou seja, o contrato poderá prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos no contrato. No mesmo art. 6º há a previsão da contraprestação da Administração Pública, podendo ser feita por: a) ordem bancária; b) cessão de créditos não tributários; c) outorga de direitos em face da Administração Pública; d) outorga de direitos sobre bens públicos dominicais; e) outros meios admitidos em lei. As garantias estão estabelecidas no art. 8º; o art. 9º obriga, antes da celebração do contrato, a constituição de sociedade com o propósito específico da parceria. Com relação a licitação a Lei 11.079, no capítulo V, estabeleceu algumas normas especiais. A modalidade contemplada deve ser a concorrência (art. 10); uma das regras especiais para a licitação é a autorização da autoridade competente (inc. I do art. 10); elaboração de estimativa do impacto orçamentário-financeiro nos exercícios em que deva vigorar o contrato de parceria público-privada (II) e declaração do ordenador da despesa de que as obrigações contraídas pela Administração Pública no decorrer do contrato são compatíveis com a lei de diretrizes orçamentárias e estão previstas na lei orçamentária anual (III); estimativa do fluxo de recursos públicos suficientes para o cumprimento, durante a vigência do contrato e por exercício financeiro, das obrigações contraídas pela Administração (IV); o objeto estar previsto no plano plurianual em vigor no âmbito onde o contrato será celebrado (V); submissão da minuta de edital e de contrato à consulta pública, mediante publicação na imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico, que deverá informar a justificativa para a contratação, a identificação do objeto, o prazo de duração do contrato, seu valor estimado, fixando-se prazo mínimo de 30 (trinta) dias para recebimento de sugestões, cujo termo dar-se-á pelo menos 7 (sete) dias antes da data prevista para a publicação do edital VI); licença ambiental prévia ou expedição das diretrizes para o licenciamento ambiental do empreendimento, na forma do regulamento, sempre que o objeto do contrato exigir (VII). O edital deverá indicar expressamente a submissão da licitação às normas da Lei 11.079 e observará, no que couber, os §§ 3º e 4º do art. 15, os arts. 18, 19 e 21 da Lei 8.987/95. Alguns elementos específicos foram indicados na lei, como a exigência de garantia de proposta do licitante, observado o limite do inciso III do art. 31 da Lei 8.666/93. Há clara indicação para a utilização da arbitragem nos contratos e podendo empregar mecanismos privados de resolução de disputas, com o edital especificando as garantias da contraprestação do parceiro público a serem concedidas ao parceiro privado. A contratação deve obedecer a legislação vigente sobre licitação e contratos administrativos, com atenção também ao julgamento que poderá ser precedido de etapa de qualificação de propostas técnicas, desclassificando-se os licitantes que não alcançarem a pontuação mínima, os quais não participarão das etapas seguintes e o julgamento poderá adotar como critérios, além dos previstos nos incisos I e V do art. 15 da Lei 8.987/95, os seguintes: menor valor da contraprestação a ser paga pela Administração Pública; melhor proposta em razão da combinação do critério da alínea a com o de melhor técnica, de acordo com os pesos estabelecidos no edital. Por fim, importante transcrever que a Lei 11.079, segundo Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO, “padece de insalváveis inconstitucionalidades, apesar das alterações que o Senado aportou ao projeto oriundo da Câmara, para minimizar um pouco o caráter escandalosamente lesivo aos interesses públicos que caracterizava a iniciativa do Executivo”. Ainda, o mesmo autor arremata com o seguinte: não nos recordamos de alguma outra lei que conseguisse reunir uma tal quantidade e variedade de inconstitucionalidades, maiormente se se considera que tem apenas 30 artigos. A tais inconstitucionalidades foi feita menção, de passagem, ao serem referidos benefícios e garantias outorgados a parceiros privados e seus financiadores” [2].



[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. São Paulo: Lumen Juris, 18 ed. p, 376.
[2] Curso de direito administrativo, p. 760.

O passado não é aquilo que passa, é aquilo que fica do que passou.   Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde)